Pietro Ubaldi & Nazarius

A vida de Pietro Ubaldi é muito metódica, ele é disciplinado, organizado, tranqüilo, não tem pressa. Para ele, cada coisa deve estar em seu lugar. Está chegando ao fim e tem consciência disso. Faltam-lhe apenas dois volumes para concluir a missão: Pensamentos e Cristo. Este já começou em março de 1969, em Cotia, na casa de campo, ambiente propício à recepção do livro Cristo.

Sua convicção de que a Obra estaria completa no Natal de 1971 era tanta, que, ao terminar A Técnica Funcional da Lei de Deus, na Páscoa de 1969, registrou em seu prefácio:

"É conhecido o conceito de uma Lei que tudo dirige. Mas não basta falar dela em termos gerais. Por isso, neste volume, nos adentramos no tema, para ver com que técnica funciona a Lei. O conhecimento alcançado é de extrema utilidade prática porque explica as causas da dor e como não semeá-las, evitando suas conseqüências. Desse modo, aprende-se a conhecer qual é a gênese de nosso destino, e a corrigi-lo quando estiver errado. A vida é canalizada ao longo de sua própria via de desenvolvimento, aprendendo-se, assim, a viver não loucamente como acontece com os involuídos, mas de forma inteligente, como os evoluídos, de acordo com uma técnica, verdadeira arte, técnica essa que se pode chamar a técnica da libertação.

Este livro é, pois, prático, utilitário, benéfico, porque através de uma cerrada psicanálise, conduz-nos a Deus. É um livro que, por meio de uma racional planificação da vida, leva à redenção e à salvação. Mas, para compreendê-lo, seria bom ler os livros precedentes, os mais recentes que deram origem a este, pelo menos um deles: O Sistema, porque as referências à teoria aí exposta, sobre S (Sistema) e AS (Anti-Sistema) são freqüentes. Terminei este trabalho no meu octogésimo terceiro ano de idade, 1969, atravessando uma enfermidade que ameaçou matar-me. Mas o espírito venceu, a Lei funcionou como já descrevi neste volume, e assim posso pôr-me ao trabalho de um novo livro, a fim de que a Obra nascida no Natal de 1931, esteja acabada no devido momento, isto é, no Natal de 1971."

Repetimos: estas palavras foram escritas na Páscoa de 1969, depois do enfarte em 10 de julho do ano anterior. A certeza era tanta que nem a doença o impediu de repetir a profecia.

 

Cotia, 2 de maio de 1969.

Nazarius,

Respondo a sua carta de 21 de abril.

Estamos ainda em Cotia. Voltaremos para S. Vicente semana que vem.

A saúde está controlada, cada mês vou ao médico em S. Paulo, que vai sempre a S. Vicente e poderá me controlar. Ele me diz que estou melhorando. Meu peso aumentou em 2 kg.

O clima de Cotia é bastante saudável para mim.

Ficaremos em S. Vicente o inverno todo.

Aproveitei os três meses aqui para trabalhar. Concluí o livro A Técnica Funcional da Lei de Deus, que tomou o lugar do livro Pensamentos. Iniciei o livro Cristo, que vai progredindo bem. Fica faltando somente um livro para terminar a Obra. Para publicá-la toda. Faltam cinco livros.

Ótimo o novo número de Avancemos.

Vejo que você recebeu diretamente do Cônsul as notícias de Brasília.

Dê as minhas notícias a Clóvis, a Dr. Albano e a D. Iracema.

Agora, faço só a primeira cópia à mão, ilegível, que dito ao gravador. Agnese copia à máquina as gravações feitas.

Esperamos você em julho, quando quiser.

Saudades a todos os amigos de Campos.

Um grande abraço do seu

Pietro Ubaldi.

S. Vicente, 10 de junho de 1969.

Nazarius,

Escrevi-lhe em março e início de maio, da casa de campo. Espero que tenha recebido as duas cartas.

No dia 19 de maio voltamos para S. Vicente. Você pode chegar quando quiser. Não me afasto daqui.

Recebi os pacotes de Avancemos, até o número 20.

Estou sempre trabalhando no livro Cristo. Agora tenho que parar uma semana para responder a todas as cartas, que vão se amontoando enquanto escrevo livros. Ainda não iniciei a gravação do livro Cristo. Quero estar mais adiantado.

Anexo os impressos para você, Clóvis e Dr. Albano.

Saudades ao Prof. Clóvis, a Dr. Albano e a todos os amigos de Campos.

Pietro Ubaldi.

No dia 27 de fevereiro de 1972, Nazarius e Leinha estavam no Rio de Janeiro. Após assistirem ao Culto Doméstico na residência da Sra. Suzana Maia Mouzinho, acompanhados de Neuza Lima, foram impulsionados a retornar a Campos. Assim fizeram, viajando no ônibus das 23:00h. No dia seguinte à tarde, receberam um telegrama do bom amigo Cláudio Picazio, com data de 28 de fevereiro, às 9:00h, fazendo a seguinte comunicação: “QUERIDO UBALDI SAUDE GRAVE CHEGANDO FIM – CLÁUDIO”. Foi um choque tremendo, porque esperavam que ele estivesse em Cotia se refazendo das energias perdidas com o calor. Imediatamente, Nazarius comunicou ao amigo Clóvis e telefonou a S. Vicente, para certificar-se da verdade, porque não acreditava. Naquele exato momento Kokoska entrou no apartamento e confirmou o telegrama. A família estava no hospital S. José, com o Professor que se encontrava internado.

Nazarius preparou a mala e viajou de ônibus às 22:00h, daquele dia, para Niterói e as 4:00 horas da manhã de 29 de fevereiro para S. Paulo. Pela madrugada, antes de chegar a Niterói, sentou-se uma pessoa ao seu lado. Quando embarcou a cadeira do corredor ficou vazia. Imediatamente olhou e não viu ninguém. Foi o aviso: o seu mestre havia falecido. Chegou a S. Vicente às 12:00h e foi direto ao Hospital. Na capela estava o seu corpo tranquilo como se estivese dormindo, em uma urna, sem ninguém que lhe fizesse companhia. Kokoska encontrava-se do lado de fora para receber quem chegasse para a última despedida. Acompanhou-o até o interior da capela e o deixou a sós com aquele corpo inerte. Nazarius chorou e chorou muito. Eram lágrimas de felicidade por ter convivido com aquela grandiosa alma, um espírito de escol que talvez durante séculos ou milênios a humanidade não conhecerá outro. Devido a sua imensa fraqueza espiritual as lágrimas eram também de egoísmo e começou a sentir-se órfão. Não poderia ouvir mais aquela voz que tão bem soava aos seus ouvidos, já habituados a ouvi-lo. Não sentiria mais aquelas vibrações que tanto penetravam em sua alma, esquecendo-se de que espírito é feito de vibrações e ele continuaria se beneficiando delas. Nazarius sempre foi sedento de água viva do Evangelho e o mestre era a sua fonte mais próxima. Esqueceu-se de tudo isso, sobretudo de que não estava órfão, e as lágrimas rolaram abundantemente.

Refeito das emoções, passou a agradecer a Deus a convivência com o seu Professor, aquela amizade pura e sincera durante tantos anos, a influência que sua Obra exerceu sobre ele, os ensinamentos recebidos pessoalmente, durante as longas conversas, o seu exemplo tão dignificante, a sua sabedoria das coisas deste mundo e do outro, o conhecimento da Lei de Deus transmitido por ele. Tudo agradeceu a Deus e ao mestre que lhe deu uma orientação segura para enfrentar as vicissitudes deste mundo. O agradecimento foi longo, porque o tempo que ficou sozinho foi bastante grande. Aproveitou a oportunidade para reafirmar o seu compromisso de trabalhar pela divulgação da Obra, usando todos os meios ao seu alcance. Pietro Ubaldi havia desencarnado aos 30 minutos daquele dia, 29 de fevereiro de 1972. O aviso no ônibus estava confirmado.

Depois chegaram alguns amigos, então, foi com Kokoska ao apartamento guardar a mala e ver Agnese que se encontrava muito abatida. Tomou um banho, fez uma pequena refeição e retornou à capela. Os funerais aconteceram no mesmo dia, às 17:30h e pouquíssimas pessoas compareceram ao seu sepultamento. Antes da saída da capela, Cláudio Picazio pediu a Nazarius que fizesse uma prece. Foi uma oração singela e comovente, de agradecimento. A hora era somente de agradecer. Sobre seu corpo foram colocadas rosas: de Agnese, uma dúzia, e de outra senhora mais duas dúzias. Nenhuma outra homenagem, além dessas, foi-lhe prestada. Sem querer, talvez Agnese tivesse recordado o número dos apóstolos de Cristo e a outra senhora o número de livros escritos. Homenagens silenciosas e significativas. Acompanhando o carro fúnebre apenas cinco automóveis. Mais detalhes sobre a morte do Professor, inclusive a belíssima carta de Cláudio Picazio, encontram-se em Pietro Ubaldi e o Terceiro Milênio, uma biografia anexada ao primeiro volume da Obra, Grandes Mensagens.

O seu corpo foi sepultado no jazido da família – Cemitério da Saudade, em S. Vicente (SP), quadra 13, 72S.

Após o sepultamento, Nazarius retornou ao apartamento com a família Ubaldi. À noite, Agnese, gentilmente, ofereceu-lhe o quarto e a cama do Professor Pietro Ubaldi para repousar. Assim, usufruiu daquelas vibrações espirituais inesquecíveis, logo após a morte do mestre!

Quem teve oportunidade de ler o último capítulo, “Chegada da Irmã Morte”, de História de Um Homem, recorda-se de como o Autor descreve a sua partida deste mundo e a chegada ao outro. A partida, os mortais testemunham, verdade; a chegada no outro só os imortais puderam testemunhá-la.

“Seu corpo ficou inerte sobre o leito. A alma, levada na visão esplêndida, tantas vezes pressentida, espasmodicamente e inutilmente procurada em vida e jamais conseguida senão na hora da morte, a sua alma voltou-se para trás apenas um instante para lançar um olhar distraído ao corpo que fora a sua prisão, mas também companheiro e instrumento de sua trabalhosa tarefa de redenção. Agora, porém, que não servia mais, não interessava mais. Como um eco, chegavam-lhe a recordação do que ele já escrevera:

“Morta entre as coisas mortas está a tua dor lá embaixo – inútil utensílio largado lá embaixo, na praia deserta de uma triste vida. Mas o seu fruto está aqui e a alma o observa: seu trabalho, sua criação e sua glória”.

Libertada do corpo, a alma atirara-se àquele incêndio de luz que tomara a forma de Cristo. Tudo ele percebia agora, mais profundamente que antes, qual sutil sensibilização nova que lhe centuplicasse a ressonância com as vibrações do universo. Percebia que elas investiam para ele vindas de toda a imensidade do infinito. E sentiu, então, o incêndio de Cristo elevar-se como coluna de fogo, para o céu. Para ele, que estava fora do espaço, aquilo significava o afastamento, o distanciamento qualitativo das infernais vibrações da Terra. Uma alegria suprema. O estridor da desordem ficava em baixo, na densa atmosfera da qual ele se livrara penetrando em outra mais sutil, límpida e rarefeita. Percebia-as menos nitidamente, à medida que iam ficando a distância; em breve não seriam mais que um eco, uma vaga recordação. A coluna de fogo atraía-o. Seguindo-a, ele foi levado para fora. Percebeu confusamente que leis novas se manifestavam em torno de si, leis pertecentes a um mundo novo no qual entrava agora.

Sentia a formação de equilíbrios ainda ignorados, segundo outros princípios que lhe permitiam deslocar-se e elevar-se não no espaço, mas em qualidade de vibração que se refinava, aprofundava-se, harmonizava-se sobretudo, levando-o da dor à alegria, do choque de dissonâncias contaditórias a uma paradisíaca sinfonia de vibrações harmônicas. Deste modo, atingiu o auge, libertou-se, transformou-se e reapareceu em dimensões de vida superiores à nossa concepção humana, seguindo a luz de Cristo.

O seu corpo foi sepultado com simplicidade e pobreza. Se poucos se haviam se preocupado com ele durante a vida, ninguém se preocupou com ele na morte. O silêncio que ele tanto amava se estendia sobre a sua campa. Nada se via do lado de fora: para o mundo, nada existira. Nada se escreveu no mármore sobre o seu nome, mas o seu corpo teve a honra suprema da pobreza; os seus funerais não foram profanados pelas declamações e a sua morte não serviu de pretexto para expressão da vaidade de ninguém. Isto era o máximo que podia obter do mundo. Assim, mesmo depois que ele restituira à terra o que a terra lhe emprestara, o seu corpo foi salvo da mentira das honras humanas. Um manto de infinita paz se distendeu sobre os pobres rostos de uma vida tão trabalhosa.”

Ao ler este volume, vemos que as profecias – duração e término da missão, ano da desencarnação, tranquilidade no momento da grande viagem, o sepultamento – se cumpriram diante de tantas testemunhas. É natural, também, depois de libertar-se do seu corpo, que sua alma se atirasse “àquele incêndio de luz que tomara a forma de Cristo.”

Assim Pietro Ubaldi, hoje na glória dos céus, está velando por todos nós, impulsionando-nos a ascender para o mesmo plano onde se encontra.

 

No dia 27 de fevereiro de 1972, Nazarius e Leinha estavam no Rio de Janeiro. Após assistirem ao Culto Doméstico na residência da Sra. Suzana Maia Mouzinho, acompanhados de Neuza Lima, foram impulsionados a retornar a Campos. Assim fizeram, viajando no ônibus das 23:00h. No dia seguinte à tarde, receberam um telegrama do bom amigo Cláudio Picazio, com data de 28 de fevereiro, às 9:00h, fazendo a seguinte comunicação: "QUERIDO UBALDI SAUDE GRAVE CHEGANDO FIM - CLÁUDIO". Foi um choque tremendo, porque esperavam que ele estivesse em Cotia se refazendo das energias perdidas com o calor. Imediatamente, Nazarius comunicou ao amigo Clóvis e telefonou a S. Vicente, para certificar-se da verdade, porque não acreditava. Naquele exato momento Kokoska entrou no apartamento e confirmou o telegrama. A família estava no hospital S. José, com o Professor que se encontrava internado.

Nazarius preparou a mala e viajou de ônibus às 22:00h, daquele dia, para Niterói e as 4:00 horas da manhã de 29 de feveriro para S. Paulo. Pela madrugada, antes de chegar a Niterói, sentou-se uma pessoa ao seu lado. Quando embarcou a cadeira do corredor ficou vazia. Imediatamente olhou e não viu ninguém. Foi um aviso: o seu mestre havia falecido. Chegou a S. Vicente às 12:00h e foi direto ao Hospital. Na capela estava o seu corpo tranqüilo como se estivese dormindo, em uma urna, sem ninguém que lhe fizesse companhia. Kokoska encontrava-se do lado de fora para receber quem chegasse para a última despedida. Acompanhou-o até o interior da capela e o deixou a sós com aquele corpo inerte. Nazarius chorou e chorou muito. Eram lágrimas de felicidade por ter convivido com aquela grandiosa alma, um espírito de escola que talvez durante séculos ou milênios a humanidade não conhecerá outro. Devido a sua imensa fraqueza espiritual as lágrimas eram também de egoísmo e começou a sentir-se órfão. Não poderia ouvir mais aquela voz que tão bem soava aos seus ouvidos, já habituados a ouvi-lo. Não sentiria mais aquelas vibrações que tanto penetravam em sua alma, esquecendo-se de que espírito é feito de vibrações e ele continuaria se beneficiando delas. Nazarius sempre foi sedento de água viva do Evangelho e o mestre era a sua fonte mais próxima. Esqueceu-se de tudo isso, sobretudo de que não estava órfão, e as lágrimas rolaram abundantemente.

Refito das emoções, passou a agradecer a Deus a convivência com o seu Professor, aquela amizade pura e sincera durante tantos anos, a influência que sua Obra exerceu sobre ele, os ensinamentos recebidos pessoalmente, durante as longas conversas, o seu exemplo tão dignificante, a sua sabedoria das coisas deste mundo e do outro, o conhecimento da Lei de Deus transmitido por ele. Tudo agradeceu a Deus e ao mestre que lhe deu uma orientação segura para enfrentar as vicissitudes deste mundo. O agradecimento foi longo, porque o tempo que ficou sozinho foi bastante grande. Aproveitou a oportunidade para reafirmar o seu compromisso de trabalhar pela divulgação da Obra, usando todos os meios ao seu alcance. Pietro Ubaldi havia desencarnado aos 30 minutos daquele dia, 29 de fevereiro de 1972. O aviso no ônibus estava confirmado.

Depois chegaram alguns amigos, então, foi com Kokoska ao apartamento guardar a mala e ver Agnese que se encontrava muito abatida. Tomou um banho, fez uma pequena refeição e retornou à capela. Os funerais aconteceram no mesmo dia, às 17:30h e pouquíssimas pessoas compareceram ao seu sepultamento. Antes da saída da capela, Cláudio Picazio pediu a Nazarius que fizesse uma prece. Foi uma oração singela e comovente, de agradecimento. A hora era somente de agradecer. Sobre seu corpo foram colocadas rosas: de Agnese, uma dúzia, e de outra senhora mais duas dúzias. Nenhuma outra homenagem, além dessas, foi-lhe prestada. Sem querer, talvez Agnese tivesse recordado o número dos apóstolos de Cristo e a outra senhora o número de livros escritos. Homenagens silenciosas e significativas. Acompanhando o carro fúnebre apenas cinco automóveis. Mais detalhes sobre a morte do Professor, inclusive a belíssima carta de Cláudio Picazio, encontram-se em Pietro Ubaldi e o Terceiro Milênio, uma biografia anexada ao primeiro volume da Obra, Grandes Mensagens.

O seu corpo foi sepultado no jazido da família - Cemitério da Saudade, em S. Vicente (SP), quadra 13, 72S.

Após o sepultamento, Nazarius retornou ao apartamento com a família Ubaldi. À noite, Agnese, gentilmente, ofereceu-lhe o quarto e a cama do Professor Pietro Ubaldi para repousar. Assim, usufruiu daquelas vibraçòes espirituais inesquecíveis, logo após a morte do mestre!

Quem teve oportunidade de ler o último capítulo, "Chegada da Irmã Morte", de História de Um Homem, recorda-se de como o Autor descreve a sua partida deste mundo e a chegada ao outro. A partida, os mortais testemunham, verdade; a chegada no outro só os imortais puderam testemunhá-la.

"Seu corpo ficou inerte sobre o leito. A alma, levada na visão esplêndida, tantas vezes pressentida, espasmodicamente e inutilmente procurada em vida e jamais conseguida senão na hora da morte, a sua alma voltou-se para trás apenas um instante para lançar um olhar distraído ao corpo que fora a sua prisão, mas também companheiro e instrumento de sua trabalhosa tarefa de redenção. Agora, porém, que não servia mais, não interessava mais. Como um eco, chegavam-lhe a recordação do que ele já escrevera:

"Morta entre as coisas mortas está a tua dor lá embaixo - inútil utensílio largado lá embaixo, na praia deserta de uma triste vida. Mas o seu fruto está aqui e a alma o observa: seu trabalho, sua criação e sua glória".

Libertada do corpo, a alma atirara-se àquele incêndio de luz que tomara a forma de Cristo. Tudo ele percebia agora, mais profundamente que antes, qual sutil sensibilização nova que lhe centuplicasse a ressonância com as vibrações do universo. Percebia que elas investiam para ele vindas de toda a imensidade do infinito. E sentiu, então, o incêndio de Cristo elevar-se como coluna de fogo, para o céu. Para ele, que estava fora do espaço, aquilo significava o afastamento, o distanciamento qualitativo das infernais vibrações da Terra. Uma alegria suprema. O estridor da desordem ficava em baixo, na densa atmosfera da qual ele se livrara penetrando em outra mais sutil, límpida e rarefeita. Percebia-as menos nitidamente, à medida que iam ficando a distância; em breve não seriam mais que um eco, uma vaga recordação. A coluna de fogo atraía-º Seguindo-a, ele foi levado para fora. Percebeu confusamente que leis novas se, manifestavam em torno de si, leis pertecentes a um mundo novo no qual entrava agora.

Sentia a formação de equilíbrios ainda ignorados, segundo outros princípios que lhe permitiam deslocar-se e elevar-se não no espaço, mas em qualidade de vibração que se refinava, aprofundava-se, harmonizava-se sobretudo, levando-o da dor à alegria, do choque de dissonâncias contaditórias a uma paradisíaca sinfonia de vibrações harmônicas. Deste modo, atingiu o auge, libertou-se, transformou-se e reapareceu em dimensões de vida superiores à nossa concepção humana, seguindo a luz de Cristo.

O seu corpo foi sepultado com simplicidade e pobreza. Se poucos se haviam se preocupado com ele durante a vida, ninguém se preocupou com ele na morte. O silêncio que ele tanto amava se estendia sobre a sua campa. Nada se via do lado de fora: para o mundo, nada existira. Nada se escreveu no mármore sobre o seu nome, mas o seu corpo teve a honra suprema da pobreza; os seus funerais não foram profanados pelas declamaçòes e a suamorte não serviu de pretexto para expressão da vaidade de ninguém.. Isto era o máximo que podia obter do mundo. Assim, mesmo depois que ele restituira à terra o que a terra lhe emprestara, o seu corpo foi salvo da mentira das honras humanas. Um manto de infinita paz se distendeu sobre os pobres rostos de uma vida tão trabalhosa."

Ao ler este volume, vemos que as profecias - duração e término da missão, ano da desencarnação, tranqüilidade no momento da grande viagem, o sepultamento - se cumpriram diante de tantas testemunhas. É natural, também, depois de libertar-se do seu corpo, que sua alma se atirasse "àquele incêndio de luz que tomara a forma de Cristo."

Assim Pietro Ubaldi, hoje na glória dos céus, está velando por todos nós, impulsionando-nos a ascender para o mesmo plano onde se encontra.

Estamos apresentando Cotia de 1970, não a Cotia de hoje, com todas as ruas asfaltadas e parte dos problemas da capital, inclusive os assaltos. Naquela época isso não existia. A "casa de campo" localiza-se a 24 km do centro de São Paulo e a 12 km de Pinheiros (bairro da capital). Fica na margem da estrada Raposo Tavares. Em 1970, Cotia tinha poucas residências e muitas árvores exuberantes. O silêncio era total, somente perturbado pelo cantar dos pássaros e o barulho natural dos animais. Local próprio para realizar qualquer trabalho intelectual, mais ainda para escrever obras como as de Pietro Ubaldi.

A Lei, que se faz presente em tudo na vida de cada um, mesmo quando não é percebida, nunca abandonou o místico da Úmbria. No fim de sua vida veio dar-lhe mais um testemunho. Para quem lhe é obediente, todas as necessidades lhe são providenciadas.

Estava na hora de escrever o Cristo e Cotia proporcionou ao seu Autor mais facilidade para entrar em contato com as correntes noúricas do que o ambiente tumultuado de S. Vicente. Em Cotia o esforço era menor. Quando escrevia, elevava-se espiritualmente, como mostra em Ascese Mística e As Noúres. Para falar de Cristo, tinha de penetrar naquele Cristo que brotava de si mesmo, como disse S. Agostinho: "Senhor, muito me fatiguei, procurando-Te fora de mim, quando Te encontras em mim."

Pietro Ubaldi iniciou a sua missão, escrevendo as Mensagens e A Grande Síntese numa grande chácara, a Tenuta Santo Antônio, na Itália, no meio de muitas árvores frondosas; nada mais justo do que terminá-la em uma chácara pequena, no Brasil, tão bela quanto a outra. As ruas de Cotia, 1970, eram semelhantes à estrada de Colle Umberto (Perúgia), terra batida, pelo menos até 1986, quando fomos conhecer a Tenuta Santo Antônio. O livro necessitava daquele silêncio para ser escrito e o seu autor o merecia, pelos 40 anos de vida missionária: Cristo, o último volume da coleção e coroamento de toda a Obra.