Falamos em uma nova moral. Aprofundemos este conceito. Segundo a velha forma mental, invocava-se a liberdade para ir em direção ao AS, com o abuso, lançando a trajetória de tipo negativo em descida involutiva, e não para ir em direção ao S, com disciplina, lançando trajetórias de tipo positivo em ascensão evolutiva. Com a nova, moral não são possíveis tais distorções porque é uma moral de substância, uma moral de honestidade e não de formas inimigas prontas a fazer a guerra, no sentido de vencer nas lutas pela vida no plano animal. Trata-se de uma moral que não é fundada nesta ou naquela religião ou ideologia, mas nas leis da vida, portanto, positiva e universal, verdadeira para todos como aquelas leis, funcionando, pois, as suas conseqüências indiferentemente, seja para os crentes, seja para os ateus. Moral reduzida à sua essência, despojada de formas tendentes a transgredi-la. Moral que consiste em ser sinceros e honestos, sem admitir hipocrisia diante da Lei.

Esta Lei regula tudo em nosso universo e o rege no plano moral, com a mesma exatidão com que o rege no plano físico e dinâmico. Diante da constatação positiva de uma sabedoria que dá prova indubitável de saber coordenar e disciplinar o funcionamento orgânico dos fenômenos nesses dois planos, impossível seria admitir que aquela sabedoria não funcione igualmente com a mesma ordem e disciplina naquele outro plano de existência de nosso universo: o moral e espiritual. Se na sua primeira parte a Lei se mostra tão ampla, comprovando tal potência e inteligência, não é possível, que ela mude de método e natureza, justamente quando se trata de dirigir essa última parte, a mais alta, a mais importante, e mesmo a mais preciosa, por se tratar do fruto do trabalho que o ser, com a evolução, teve de realizar para poder chegar àquele nível. A Lei é uma só: o universo físico, dinâmico e psíquico é um só, a regulamentação do seu funcionamento deve ser só uma.

Com a nova moral caem as distinções fictícias humanas de forma e fica a substância. Chega-se então à conclusão de que ser ateu ou crente é a mesma coisa quando o somos honestamente. Salva-se quem é honesto, ainda que ateu, e perde-se quem é desonesto, mesmo se religioso e crente. Compreende-se assim que as religiões de nada valem quando não são vividas honestamente, e que a hipocrisia representa para elas um perigo mortal, um mal que termina por matá-las. Para esta nova moral mais valem as intenções que as formas exteriores. É condenado quem, por astúcia, consegue parecer irrepreensível, porque sabe agir de forma escondida, e é perdoado aquele que, por não saber disfarçar, parece culpado.

Quando um míssil é lançado, deve atravessar os mesmos espaços, com os mesmos perigos, e superar os mesmos obstáculos. Os problemas a resolver são portanto os mesmos, trata-se de um míssil comunista ou do ocidente democrático. Diante das leis dos fenômenos, as ideologias de nada servem. Só por ignorância se pode crer que nossa fé e nossas opiniões podem mudar alguma coisa no funcionamento da realidade. Por isso se vê quanto a nova moral é diversa da antiga, que acreditava em Deus não através da mente com que se pode raciocinar, mas entendia-o antropomorficamente, nele vendo um senhor que, pelo direito do mais forte, de forma arbitrária recompensa ou castiga segundo os seus planos escondidos no mistério. Com a nova moral, o destino, segundo o qual se desenvolve o percurso de nossa vida, se torna uma trajetória calculável, segundo o lançamento realizado por nós, do qual se podem prever e inteligentemente corrigir as conseqüências.

Introduzimos, no capítulo precedente, o problema de ser possível alguém sacrificar-se, violando a inexorável justiça da Lei, em benefício de quem não tenha merecido tal vantagem. Esta é a posição em que se encontra o idealista que se sacrifica para salvar um mundo que não tem a menor disposição de se deixar salvar por ele. Vejamos agora quais são as fases que ele atravessa na sua tentativa de beneficiar o outro.

1º) Dada a sua natureza honesta, o idealista crê num mundo semelhante a ele, isto é, que à aparência corresponde uma realidade, que as palavras sejam verdadeiras, que a religião, moral, espiritualidade e idealismo sejam coisas vividas seriamente.

2º) A esta fase, que se poderia chamar de inocência, segue-se a do descobrimento de que, sob aquela aparência há uma realidade completamente diferente. Daí provêm a amarga surpresa de constatar que a sabedoria do mundo consistia em fingimento e engano. Este descobrimento, no entanto, é uma superação da fase precedente de ingenuidade.

3º) Segue-se um estado de terror pelas possíveis conseqüências em percorrer  tal trajetória negativa e destrutiva, em descida para o AS, em vez de positiva e salvadora, em ascensão para o Sistema. Devido ao ânimo honesto do idealista, a sincera preocupação de advertir o próximo do perigo que corre, a fim de que mude de rumo.

4º) Surge uma resposta hostil da parte de quem é incomodado nos seus métodos, aborrecido por vê-los descobertos e denunciados, prontos a reagir contra aquelas tentativas de redenção espiritual, que não lhe interessam, sendo entendidas como um ato de agressão contra o qual há que defender-se, eliminando o incômodo moralista. Mas, analisando-se a outra face do problema, é necessário também compreender que ao homem comum, tão mergulhado na sua involução, lhe é difícil atravessar a vida sem ficar de algum modo massacrado, não lhe sobrando espaço para fadigas suplementares, como as que lhe quereria impor o ideal, a serem acrescentadas às suas já duras penas pela luta da existência.

5º) Segue-se uma nova queda da ingenuidade do idealista, tão sabedor das coisas do céu, mas tão pouco conhecedor no tocante às bem diversas coisas da Terra. Além do mais, a sua função biológica não é, como para as massas, a conservação da espécie, mas sobretudo a sua evolução. Assim, o idealista aprende às próprias custas, a conhecer o ambiente terrestre, tão diferente do seu. Com as novas experiências supera o seu estado de inocência, e não comete mais o erro de pretender coisas superiores da animalidade humana. Por isso, é lógico que o ideal na Terra seja utilizado sobretudo para fins concretos e imediatos da vida, como é lógico também que, num regime de luta, o nobre desejo de salvação por parte do idealista seja entendido como ato de agressividade, ou, no mínimo, como sem sentido.

6º) Sem mais ilusões, há o reconhecimento da verdadeira natureza do homem, não evoluído e nem desejoso de evolver; mantendo absoluto respeito pelo sua liberdade de escolha e decidida vontade de permanecer naquele nível. Há o reconhecimento da impossibilidade de forçar a correção do percurso da trajetória, já lançada e estabelecida, dada a necessidade de que tais correções não podem ocorrer a cada um senão por suas duras experiências pessoais, isto é,, aprendendo exclusivamente às próprias custas, e não por meio de prova alheia ou de conselhos gratuitos. Em suma, uma evolução justa, conseguida com o próprio esforço e suportando as conseqüências dos próprios erros.

Essa posição final está em concordância com a justiça. Com isso o idealista se despoja de sua ingenuidade e aprende a conhecer o mundo. Assim não tem mais necessidade de defender-se de um inoportuno estado de luta, que o aborrece, mas de alcançar um outro de compreensão e pacífica convivência. A evolução, porém, que a febre do idealista gostaria de acelerar, se detêm e espera, enquanto o involuído pode afundar-se nos baixos planos da matéria. Esta é a vitória do mundo, que, em seu ambiente, tenta afastar o ideal como um intruso. Esta é a realidade e a mais importante coisa deste mundo. O problema mais urgente para resolver é a sobrevivência e isso a qualquer preço. A moral, os princípios, a religião vêm depois. Primeiro a necessidade de defender-se contra todos; somente mais tarde, com o aperfeiçoamento, se vai pensar em justiça. Primeiro os meios materiais para manter a própria vida na Terra; depois a religião e o ideal para assegurar o próprio aperfeiçoamento a uma vida no céu. O fim é sempre o mesmo, o de sobreviver. Por isso, dado que o Além e as religiões que dele se ocupam são em grande parte mistério, jamais sacrificar o certo pelo duvidoso. É medida de sabedoria, antes de tudo, fazer os próprios negócios neste mundo e somente, quando for oportuno, ocupar-se daqueles do outro, dos quais há tão pouca certeza.

Assim a evolução é lenta, porque a vida é prudente e não se arrisca no inexplorado, em tentativas plenas de incógnitas. A evolução pede esforços e o indivíduo, que tem recursos limitados, calcula-os preferindo pensar nas vantagens imediatas que percebe melhor e que lhe parecem mais seguras. A providência presume um estado de ordem, enquanto que o nosso mundo ainda está envolvido no caos do AS. Por sua parte, o idealismo se torna mais consciente da dificuldade e menos propenso aos fáceis entusiasmos tão comuns em tal campo. Ele aprende que o ideal, para frutificar, deve trabalhar mergulhado na imundície humana e então não se expõe a insucessos, pelos quais o mundo depois o ridiculariza. O idealista, também se torna mais potente, evitando expor-se irrefletidamente como um cordeiro, somente para deixar-se devorar. Ao contrário, será um cordeiro que não se desperdiçará, mas fará multiplicar para o bem de todos o seu sacrifício.

Falamos há pouco de um novo tipo de moral positiva e universal; e dissemos que ela é objetiva, funcionando tanto para os crentes quanto para os ateus e materialistas, porque o fenômeno se realiza indiferentemente para todos, sem levar em conta suas opiniões. Trata-se de uma moral que depende dos fatos e não de nossa fé neles; uma moral que, se for compreendida, pode revolucionar o nosso louco modo de viver, transformando-o em outro mais sábio e, portanto, menos doloroso. Por quê?

Já explicamos, anteriormente: quando um determinado tipo de personalidade ou circuito de força, percorre a sua órbita, se ele é bom atrai do ambiente forças boas e com elas se combina, produzindo bons acontecimentos e favoráveis ao indivíduo. Mas se é mau atrairá do ambiente forças más e com elas se combinarão as forças do seu circuito, produzindo maus eventos, que lhe serão desfavoráveis. E isto será automático e fatal, porque a atração ou repulsa e as combinações que delas derivam, dependem do tipo de forças de que o indivíduo é feito, porque ele próprio com elas construiu a sua personalidade.  Eis porque o destino é realmente fatal. Ele é fatal, porém, na sua fase de efeito e não na fase de causa.

A moral que deriva de tais constatações é que se torna necessário ter uma conduta reta, porque as nossas obras nos seguem, e suas conseqüências não nos deixam mais até que as tenhamos exaurido plenamente. Cada impulso nosso, se é relativamente livre para iniciar novas trajetórias no momento em que são lançadas, é logo posto no canal causa-efeito, em que o movimento se torna determinista. Sobre a nossa liberdade prepondera a Lei, que, se não nos limita na escolha das causas, nos liga aos seus efeitos, de que não nos permite evadir. Permanecemos então fechados dentro do percurso da trajetória lançada sem possibilidade de fuga, e deveremos fatalmente segui-lo até o fim, isto é, até o ponto em que ele, divergindo da Lei, nos leva a bater contra as paredes do canal, dentro do qual ela impõe que tudo se mova. O choque que então receberemos será o golpe corretivo que nos levará a abandonar a velha trajetória e a iniciar uma nova, e este desastre será a nossa salvação.

Quantos destinos, que parecem venturosos, não se estão movendo nessa direção! Isso ocorre quando eles são lançados no sentido anti-Lei, fundados no engano, no abuso, no egoísmo, com vantagem própria e dano alheio. Outros destinos estão em fase de golpe corretivo, outros em posição de trajetória corrigida, e todos vão sendo inexoravelmente canalizados dentro da norma, para o seu desenvolvimento, estabelecida pela Lei. Por mais que o ser goste de ficar no caos, natural ambiente do AS, no fundo dele está sempre a ordem do S, que ninguém pode anular. Diante da Lei, para qualquer um que a transgrida, não há salvação, trate-se do mais poderoso ou o mais astuto da Terra.

O mundo não compreende tudo isso, e paga duramente pela sua ignorância ou vontade de não compreender. Somos livres na escolha, porém, responsáveis pelos conseqüências; liberdade e responsabilidade que nos ligam, inexoravelmente, aos efeitos das nossas ações. Se compreendêssemos tudo isso, estaríamos bem preocupados em não fazer o mal. Deixamos de ser inteligentes quando o praticamos, iludindo-nos com o fato de crer que isso ocorra impunemente, só porque não vemos logo surgir as conseqüências, das quais acreditamos poder fugir. É preciso olhar mais longe. Somente os muito ingênuos acreditarão que os efeitos do mal possam anular-se gratuitamente sem que ninguém pague. Apenas eles crerão que uma força lançada se possa deter no vazio sem ter de percorrer todo o seu caminho.

Essa moral revoluciona o modo normal de conceber a vida, como luta para vencer. A realidade é uma outra. É vencedor não quem sabe conquistar domínio glória, poder e posses terrenas. O verdadeiro rico e poderoso é aquele que é proprietário de um bom destino, é o indivíduo cuja personalidade é composta de forças benéficas, positivas, sadias que, por sua vez, lhe atraem eventos favoráveis. Entretanto é pobre e miserável quem é proprietário de um mau destino, um indivíduo cuja personalidade é composta de forças do tipo ruim, negativo, doente, que, pois, atraem forças e eventos desfavoráveis. O mundo está cheio de coisas, tanto boas como más, e que venham a nós umas ou outras depende de nós mesmos, isto é, daquelas que atraímos. Um homem pode ser o senhor do mundo, mas se possuir somente as qualidades que atraírem o mal, tudo lhe será desfavorável, até que esteja arruinado.

O que rege a nossa vida são estas forças interiores. As verdadeiras riquezas são de outra natureza. O que conta é o que temos dentro de nós, aquilo de que somos feitos, e não o que está fora, ligado somente ao exterior. Eis o nosso verdadeiro patrimônio, inalienável, que ninguém nos pode roubar. Eis um método para tornar-nos independentes dos vencedores por meio da força. Estes podem empobrecer-nos e matar-nos, mas não podem deslocar um ponto em nosso destino. E se estes nos empobrecem e nos massacram é porque merecemos. Eis que ao princípio da luta pela vida com o triunfo do mais forte se substitui o princípio da Lei e da sua justiça.

Estejamos atentos em não lançar trajetórias na direção do mal, porque depois teremos de percorrê-las até o fim, pagando com o nosso sofrimento. Seremos, então, perseguidos por uma série de acontecimentos hostis, dos quais fomos a causa: primeiro por nos termos construído de modo ruim; e, como conseqüência, por termos atraído somente as forças do mal, das quais, no entanto, os que se construíram bem ficam imunes, já que atraíram as forças do bem. Atentos, pois, porque não há coisa que doa tanto quanto o ter que corrigir uma trajetória lançada contra a Lei. A esta altura, podemos compreender toda a técnica deste fenômeno. Com uma conduta reta, construamos um patrimônio de forças boas, porque então todo o bem virá a nós. Se, ao contrário, quisermos forçar a Lei, pondo-nos contra ela, construindo-nos um patrimônio de forças negativas, todo o mal virá e estaremos inexoravelmente ligados a um destino de desgraça.

É preciso compreender: tudo o que pertence ao AS é negativo, destrutivo, mesmo para o seres que nele vivem. Trata-se de um reino invertido, onde a ordem do S se transformou em caos, a sua unidade, em separativismo; o seu poder construtivo, em força destrutiva, isto é, fraqueza e enfermidade. Os elementos constitutivos do AS são rivais que vivem em disputa, não amigos que ajudam reciprocamente. Estes se irmanam somente para tirar proveito uns dos outros e suas uniões se desfazem tão logo cesse o interesse de cada um. Esta sua estrutura é o ponto do AS, por isso ele não pode deixar de desagregar-se.

Quando um indivíduo, com sua conduta errada, viola a Lei, inevitavelmente ele entra em negatividade, caos e separatismo do AS, o que o põe em posição de inferioridade, de fraqueza, de doente diante da vida. Então a vida tenta eliminar tal elemento de corrupção, que se colocou fora da lei. Em vez de protegê-lo em seu seio, ela, a vida, abandona-o sozinho, ao seu desejado destino de rebelde, em razão do seu negativismo destrutivo. Como amigos, ele só encontrará seres  do tipo AS, isto é, aliados egoístas prontos em traí-lo. Quanto mais avançar no caminho do mal, tanto mais afundará nesse ambiente.

A salvação está somente na recuperação, retomando o caminho do bem. Para fugir àquela vontade de morte que está no AS, basta livrar-nos do mal que nos torna vulneráveis. O micróbio ataca o ponto débil. O destino nos assalta onde pecamos e por isso é que se torna necessária a retidão para nos curarmos. Se Cristo tivesse aceito o AS, embora como lhe foi oferecido, teria caído dentro dele, tornando-se rei na Terra, teria perdido a oportunidade de mostrar-nos, com o próprio exemplo, como fugir do AS para o S, que era o verdadeiro objetivo da sua paixão.

Eis que a verificação do que ocorre em nossa vida, não depende do acaso, mas é tudo pré-ordenado segundo esse jogo de forças, sua natureza, atração e repulsão. O destino é construído por nós mesmo e está em nossas mãos. Verdadeiramente, ainda que não estejamos conscientes, vivemos num mundo livre e responsável, em que não domina o fado cego, mas a inteligência de Deus; não o acaso, mas a justiça. Procuremos, pois, lançar uma boa trajetória para o nosso futuro. Uma vez que se faça o esforço de lança-la, ela irá por si mesma, segundo a sua natureza, na direção de nosso bem ou nosso mal, e nos arrasta comparativamente à maneira de veículo em que viajamos, levando ao ponto devido, segundo o mérito e a justiça.

Em substância, a nossa vida é um destino em movimento, que percorre o seu trajeto estabelecido pelo tipo de forças que contém. Infeliz é o afortunado que tem sucesso enquanto segue a sua trajetória anti-Lei, dirigida para o mal, porque tal sucesso o reforça naquela direção. Deverá, pois, ser mais forte e doloroso o golpe corretivo necessário para reendireitar-se e salvar-se. A mais profunda realidade da vida é que os acontecimentos que a constituem não ocorrem de forma desordenada e por acaso, antes estão logicamente ligados, para cada indivíduo, ao longo do fio de seu destino. É que tal fio é constituído por um desenvolvimento de forças ao longo da linha causa-efeito, segundo uma trajetória bem definida, numa dada direção. Tais acontecimentos não são isolados, e quem compreendeu vê que a vida é feita de um concatenamento em sucessivos momentos, ao longo de um único percurso, razão pela qual eles adquirem uma direção, uma meta, um significado.

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Continuemos a falar da construção de um novo tipo de moral, positivo e universal. Essa moral pode ser preventiva, constituída por normas de boa conduta, pelo lançamento de trajetória sadias, isto é, construídas segundo a Lei, e seus correspondentes destinos; e pode ser também corretiva constituída por métodos que endireitam as trajetórias erradas e os correspondentes destinos. Como se vê, trata-se de uma moral diferente da antiga, que se limitava ao exterior, e intervinha quando o fato estava realizado, sem chegar a raiz do fenômeno. Trata-se de uma nova moral, que penetra profundamente no íntimo da consciência, respeita-lhe a liberdade mas impõe-lhe responsabilidade, enquanto a deixa livre para toda a escolha, e, pois, inexorável na exigência do pagamento de suas conseqüências. Uma moral que nos ensina a segurar o leme na travessia da vida, a dirigir a trajetória do seu percurso, lançando-o na direção justa, ou se errada, obrigando-a a corrigi-la. Pode-se assim dispor de medidas preventivas e corretivas do mal, antes desconhecidas, impedindo-lhe o nascimento ou dele afastando-se a tempo, evitando assim chegar-se ao choque fatal com a Lei. Trata-se em suma, de uma moral das causas e não só dos efeitos, mais sutil e inteligente, mais sábia e poderosa que a atual, com ação mais penetrante no interior, com efeitos decisivos, o que torna possível uma correção tempestiva, sem chegar àquele choque com a Lei, que pode ser catastrófico, mas que representa a natural solução do fenômeno quando é lançado no seu fatal desenvolvimento.

Esta se pode chamar a moral das intenções, porquanto atinge o ato no seu nascimento, no momento espiritual da sua gênese, já que está na raiz de cada movimento nosso, momento do que tudo mais deriva. É nesse primeiro tempo que, com a nova moral, se pode intervir, no do lançamento, quando este ainda não estabeleceu uma trajetória e tudo é mais maleável porque ainda está em fase de formação. Quando a trajetória é lançada, o erro básico já foi definido e o dano está em ação. Então é tarde, a correção terá que ser muito mais laboriosa do que antes, quando tudo isso ainda não tinha ocorrido e podia ser prevenido, impedindo-lhe a primeira formação. Consegue-se assim chegar antes do mal, como por exemplo, quando se usa a desinfecção e higiene, que previnem a formação e a difusão de enfermidades, evitando um ambiente inadequado.

Estes novos métodos podem levar a um deslocamento fundamental em nossa vida, pelo qual nos tornamos senhores de nosso destino, ao invés de sofrê-lo passivamente. É certo que o destino pela lei de causa e efeito, é fatal; porém se soubermos lança-lo na direção justa, ele será fatal a nosso favor, ao passo que o é em nosso prejuízo se, como freqüentemente acontece, o lançarmos na direção errada. É necessária, porém, uma psicanálise da personalidade e um conhecimento do tipo de forças benéficas, uma espécie de medicina preventiva do espírito, que cure os males a tempo. Ela os previne antes de se formarem, evitando agredir o enfermo com punições (cárcere, inferno), que seria uma autodefesa tardia, uma forma de vingança, que não adianta porque confirma e consolida o mal, ao invés de eliminá-lo. Este é um método de guerra e responde a um princípio de luta para subjugar, e não de cura para restabelecer, que se rebela contra o atingido pela enfermidade, para eliminá-lo; não vai contra a doença que o atingiu, contra as causas, mas contra os efeitos. Trata-se apenas de uma reação egoísta contra uma ameaça ou uma ofensa produzidas por aquele mal, e não por interesse na sua cura. Para livrar-nos do perigo que ele representa, busca-se eliminar o enfermo  em lugar do mal.

Quanto mais o homem se civiliza, tanto mais aguda se torna sua inteligência e aumenta a sua capacidade de penetração até às raízes do fenômeno e, consequentemente, a capacidade de dominá-lo. Assim, com o progresso da civilização, se vai sempre substituindo ao conceito de justiça positiva “a posteriori”, o de educação preventiva, primeiro e depois, corretiva do mal. Este é de fato critério que, em matéria penal, vai conquistando espaço, tentando eliminar a formação de uma dupla fila, a dos culpados passíveis de punição e a das suas vítimas, isto é, vai-se eliminando a relação entre o mal realizado e o mal recebido.

Formou-se uma nova moral alicerçada na compreensão  e não no temor, na convicção das vantagens, oferecidas a todos, e não na imposição da autoridade. A vida, que é utilitária, não poderá deixar de aceitar essa moral, compreendendo a conveniência que há no conviver pacificamente, tornando leves os perigos e as fadigas da luta, o que permitirá o trabalho e a conquista de um mais alto nível evolutivo. Houve um tempo em que a moral existia em função daqueles que comandavam e que, visando à própria vantagem se faziam representantes da ordem e da justiça e constituíam a classe das pessoas honestas. Hoje, em lugar dessa moral egoísta de classe, a nova moral existe em função da utilidade coletiva. Houve um tempo em que uma pessoa valia na proporção de sua riqueza, de sua classe social, de sua posição de comando, isto é, segundo o domínio que podia usar para submeter os outros a si mesmo. Hoje se começa a apreciar o indivíduo em razão do rendimento que ele pode dar como produção e atividade em benefício de todos. Por isso, no passado, se glorificava a virtude da obediência, porque se buscavam servos para subjugar e não colaboradores.

Foram exaltadas as três virtudes franciscanas: a pobreza, a castidade, a obediência, que queriam podar o indivíduo no plano animal humano, na esperança de poder elevá-lo a um nível evolutivo mais alto. Mas hoje, à virtude da pobreza ociosa e improdutiva, se substitui a virtude do trabalho, indispensável para elevar o nível de vida, base de uma civilização mais avançada. À virtude repressiva da castidade e da renúncia, um dar de contas às paixões baixas e ferozes então dominantes, mas que induzia à posição negativa do não fazer, se substitui hoje a virtude positiva motivada no dinamismo criativo do fazer, isto é, o exercício de uma paixão mais alta no plano da inteligência. Deixam-se em seu devido lugar as funções fisiológicas e nervosas, e se desloca o centro da vida para um outro nível mais evoluído. À virtude da obediência, referida acima, se substitui a da produtividade e da recíproca compreensão  necessária para consegui-la. O exercício dessas três virtudes valia enquanto funcionava como correção das trajetórias mais comuns naqueles tempos, dirigidas no sentido oposto: abuso de riqueza, de sexo, de domínio. Então a autoridade, não só para corrigir, mas também para manter-se em pé, tinha que exercer a função de domador. Mudadas, porém, as condições de vida, encontrando-se esta em mais avançada fase de evolução, é natural que a moral evolua e surjam virtudes de tipo diverso. Encontramos hoje ainda habituados à antiga moral convencional, que resiste em adaptar-se ainda às mudadas condições de vida. Aquela era peremptória, ameaçadora, preceptista, ao passo que hoje necessitamos de uma moral de compreensão. Os problemas analisados mais a fundo assumem outros aspectos e perdem seu absolutismo. Por exemplo, condenava-se o egoísmo. Mas se quisermos ser sinceros, como se pode não reconhecer que o egoísmo é a primeira condição de sobrevivência em nosso baixo nível biológico? Como suprimir o egoísmo, se ele desempenha a função de defender o indivíduo? Como se pode, honestamente, propor como virtude o que num regime de luta é antivital? É assim que nasce a hipocrisia, por parte do falso altruísta que exalta uma tal virtude, mas só para os demais, buscando mesmo desenvolvê-la nos outros para aproveitar-se deles em função do seu próprio egoísmo. É natural que quanto mais os outros se sacrifiquem em seu benefício exercitando o altruísmo que eu incentivei, tanto mais poderei utilizar deles a favor do meu egoísmo. Eis uma das razões pelas quais, no passado se inculcavam certas virtudes cristãs com tanto zelo, e porque rechaçá-las provocava uma espécie de escândalo e de condenação contra quem não as praticava. Tudo isso é lógico conforme às leis da vida.

A velha moral nada mais resolve. Melhor será deixar de pregá-la hipocritamente e, em lugar de reprimir um egoísmo necessário à vida, aumentado-lhe assim o estado de luta, a inteligência está em desenvolver esse sentimento, redirecionando-o em sentido coletivo, para defender-nos todos juntos, em vez de esganarmo-nos para nos destruirmos. Respeitar então o vital impulso egoístico, mas levá-lo a dilatar-se até abranger um grupo cada vez mais vasto, capaz de suprimir a cada ampliação, um limite divisório e um setor de guerra, lucrando todos em paz e bem-estar. Pode-se, pois, passar do egoísmo a um verdadeiro altruísmo sem hipocrisia, levando em conta a realidade biológica e pedindo apenas o que a vida pode dar. Só se pode passar do egoísmo ao altruísmo, através da dilatação do primeiro, e jamais por sua negação antivital, contra qual o ser se rebela, concedendo apenas uma aceitação fictícia em forma de mentira. Neste caso não é mais útil uma virtude de tal tipo. Mas ao contrário, se for redirecionado o seu movimento ele não toma uma direção negativa, agressiva, destrutiva; mas positiva, enquanto desenvolve, em sentido construtivo, um natural impulso de vida, tendo em vista uma vantagem, e não assumindo uma forma de opressiva mutilação. Então o indivíduo aceita o melhor, porque satisfaz o instinto de crescimento, que está na base da evolução. Repensando o problema do egoísmo em termos de desenvolvimento de amplitude, em vez de repressão, ele se resolve de modo natural no sentido evolutivo.

Já tratei alhures desse assunto. Ao leitor superficial há de parecer repetição retomar não só este como também outros. Mas retornar a um tema é levá-lo sempre um pouco adiante, vê-lo mais a fundo, completá-lo e aperfeiçoá-lo. Assim o leitor assiste o seu contínuo desenvolvimento.

É interessante ver como a sabedoria da vida resolve certos problemas, manobrando o homem ignorante através de seu inconsciente. Os psicanalistas afirmam que as motivações “reais” são as instintivas, inferiores e que as outras, ideais, superiores, nada mais são que coberturas para justificar aquelas diante dos princípios. A realidade seria, pois, a das motivações mais baixas, vizinhas da animalidade. Não acusamos tais movimentos instintivos. Observamos a técnica do fenômeno. De que modo a vida resolve a contradição entre o ideal e a realidade biológica, entre Cristo e o mundo? O primeiro quer que sejamos cordeiros, mas se formos cordeiros o mundo nos devora. Então, o Evangelho, tão cheio de amor, nos empurraria para a morte? E porque nos escandalizamos quando a essa pretensão se responde com a hipocrisia?

A questão está nestes termos: existe um antagonismo absoluto entre o Evangelho e o mundo, isto é, entre o ideal de Cristo e as leis biológicas vigentes no nível evolutivo do animal humano. Obrigados os dois opostos à convivência, é inevitável a hipocrisia, isto é, uma posição de contradição entre o que se prega e o que se pratica. A Igreja, devendo representar Cristo no mundo, não podia deixar de ficar prisioneira dessa contradição. Há fatos que não podem ser deslocados: 1º) Os ministros de Cristo devem pregar o Evangelho, porque este é o seu dever de ministros e nisto consiste a sua função e a sua missão; 2º) É verdade que há contradição em pregar sem praticar; porém praticar o Evangelho, num mundo ainda não civilizado como o nosso, isto é, oferecer-nos como cordeiros aos lobos, leva ao fim de Cristo, isto é, a sermos rapidamente eliminados; 3º) Quando se morre, embora na condição de mártires e santos, não se pode cumprir a função e a missão de pregar o Evangelho; 4º) Portanto, para poder pregar o Evangelho, é necessário não o praticar; 5º) Dessa forma a contradição e a hipocrisia são inevitáveis.

Deste modo, a Igreja é justificada, porque se vê obrigada a recorrer a tal solução. Nasce assim o consórcio entre a religião e a hipocrisia. Mas esta não é uma solução desejável. O mal permanece. Então, para não culpar a Igreja, termina-se por culpar Cristo que pregou um Evangelho que está em contradição com as leis da vida vigentes no plano humano, e, pois, inaplicáveis às massas. Para justificar a Igreja temos que culpar o Cristo, o que é uma solução mais grave.  Isso demonstraria que o ideal é impraticável na Terra e acarretaria a queda total, porque sem o conceito de evolução, sem um telefinalismo, a vida perderia o significado.

Será culpa da Igreja e dos cristãos que não seguem Cristo, plenamente, até à Cruz, ou foi Cristo, que propôs um método de vida que a conduz à morte? E, no entanto, há uma solução que justifica tudo sem inculpar ninguém: consiste em aceitar a contradição, reconhecendo-lhe a existência e o dano, mas aceitando-a como um mal necessário, justificado por ser transitório, uma fase evolutiva, feita para ser superada e depois abandonada pela vida. O Evangelho é de fato aplicável num mundo mais civilizado, que pratique métodos mais progressivos de vida, dos quais já estão detectando os primeiros sintomas. É verdade que o fenômeno só é concebível em função de um completar-se numa futura fase hipotética. Mas é também verdade que a isso nos levam a nossa razão e a lógica da vida.

Por ora, a caso está resolvido, usando o método conciliatório, o único que pode permitir a pacífica convivência dos opostos no mesmo terreno, sem que um destrua o outro como gostaria. Claro que se trata de dois inimigos. Mas essa convivência é necessária, porque o ideal deve cumprir a sua função evolutiva, por meio de uma lenta penetração no mundo, que gostaria de eliminá-lo e que, no entanto, deveria ser por ele transformado. Este resultado não se poderia atingir com o método unilateral da vitória de um termo sobre o seu oposto. freqüentemente a contradição é um casamento entre opostos, a fim de que estes, como pólos da mesma unidade, ligados no mesmo circuito, possam colaborar para um fim comum. É assim que a sabedoria da vida terminou por casar o ideal e a realidade biológica, evoluído e involuído, Cristo e o mundo. Desse modo, o primeiro termo não deixa sozinho, embaixo, o segundo, mas desce ao seu nível e a ele se junta para elevá-lo a um outro plano de existência. Trata-se de um trabalho de milênios, de lenta penetração dos princípios do cristianismo no âmbito terrestre, realizando, sob o manto do ideal, uma obra de civilização da besta, sempre pronta a reaparecer tão logo surja a necessidade de defender-se na desesperada luta pela sobrevivência neste mundo.

Assim pode-se compreender, sem culpar ninguém, a posição de um cristianismo, que não pratica o que prega. Compreende-se também a sua função de progressiva realização do ideal por sucessivas aproximações. Entende-se o seu trabalho de transformação evolutiva, situando a atuação plena do Evangelho não no presente, que não pode oferecê-la senão em pequenas doses percentuais, mas longe, mais adiante, no futuro. De fato, este é um caminho que se está percorrendo, sempre mais avançado no sentido daquela atuação. Compreendido assim o fenômeno, cessa a culpa das adaptações que tanto depreciei nos escritos precedentes, pelo fato de que, sem um recíproco ajustamento, não era possível uma aproximação entre dois extremos opostos e sem isso um deles ficaria eliminado. Então o mundo teria ficado sem o ideal como impulso de evolução, enquanto para o ideal descido à terra não haveria outro estado senão a morte. A realidade é que Cristo está no céu e a Igreja na Terra, e o comando pertence ao mundo. Cristo está no S e aqui estamos no AS, reino do involuído, no seu baixo nível biológico. Assim se explica e justifica tudo: o antagonismo entre os dois opostos, Cristo e o Mundo, a contradição em que se encontram os cristãos que de fato não seguem Cristo, por isso a necessidade das adaptações que constituem hipocrisia, e não se pode acusar quem as pratica, nem julgá-lo culpado. Eis porque, sem eles, o ideal ainda em estado teórico, não poderia existir e ser conhecido na Terra. Estaria faltando a idéia de evolução e de um telefinalismo para o ideal.

Se essa contradição existe, se a vida aceita tal fenômeno, é lógico que este deveria ter a sua função útil que só agora, indo mais fundo, pudemos ver. Confirma-se a convicção de que a vida é feita de uma sabedoria que tudo dirige do melhor modo possível, com maior rendimento útil, mesmo que possa parecer o contrário, a que não conheça todos os fatores do fenômeno. O elemento que não se tomara em conta era o estado involuído do ser humano, razão pela qual era levada a exigir dele uma excessiva e avançada aproximação de Cristo, o que na Terra, no AS, é impossível. Assim se explica que, embora traído sob a forma de hipocrisia, o Evangelho subsista neste mundo, sem há muito ter-se evaporado nos céus. Embora iluminando, apenas do alto, a estrada a percorrer, ele permanece ainda que de fato esta estrada não seja percorrida.

Que encontramos então na Terra, por trás das aparências? De um lado vemos os lobos, à procura de cordeiros evangélicos sequiosos para devorá-los de outro, vemos que a sobrevivência só se torna possível quando os lobos se disfarçam em cordeiros, isto é, assumem a auréola de pessoas honestas, justificadas pela sagrada necessidade de sobreviver. Em tal mundo é necessidade vital, portanto, biologicamente não é culpa fazer do Evangelho um uso diverso daquele pelo qual foi entendido, isto é, utilizá-lo como um manto para esconder a verdadeira natureza. Mas se não há outro meio para não sermos devorados e se estas são as regras do jogo da vida no baixo nível humano, concluir-se-ia que tudo é justo e ninguém culpado.

O problema é colocado pela própria vida de tal modo que não se pode resolvê-lo senão por uma destas duas vias: 1º) Ou negamos, por orgulho, que o homem se encontra ainda numa fase involuída de animalidade, perdendo-se a única atenuante de suas necessárias evasões diante dos ideais superiores, que nos induziria a concluir que, sendo um ser superior e consciente, como se afirma, é um mentiroso, porque não faz o que diz; 2º) Ou reconhecemos que o homem está ainda numa fase involuída de animalidade, e então podem ser justificadas as evasões necessárias à sua sobrevivência, não se vendo culpa na hipocrisia de que se vale como indispensável arma de luta. Mas então ele não é o ser superior e consciente como se pensa. Em suma, há um erro na contradição entre a teoria e a prática, cuja causa é preciso encontrar. Não há outra escolha: ou devemos ser perdoados, porque na condição de involuídos somos inconscientes; ou somos conscientes e evoluídos, mas culpados de mentira. Cada um pode escolher a interpretação que lhe convier: ou somos desgraçados que miseravelmente lutam no nível animal, usando todos os meios de que dispomos, inclusive o ideal; ou, na verdade, somos superiores, o que implica na responsabilidade e obrigação a um adequado tipo de vida, com deveres que os outros não têm, embora traidores do ideal caso não o observemos. Não é possível qualificarmo-nos como seres conscientes sem ter que assumir as relativas responsabilidades e deveres. Se assim não se procede a hipocrisia é evidente.

Qual é a solução? Aquela já escolhida pela vida, deixando o ideal como está, em seu estado teórico, e a realidade como é, em seu estado prático? Ou procurar induzi-la através de lenta maturação a aproximar-se cada vez mais de sua realização? Sem dúvida tentar aproximar-se da perfeição , embora vivendo num estado imperfeito, é a solução. Não é necessário que o homem compreenda aquilo que faz. A vida se ocupa de obrigá-lo a fazer aquilo que para ele é melhor e isso automaticamente. Quando a hora está amadurecida para que tal fato ocorra, trata-se de uma revolução, de uma descoberta de novas idéias, ou de mudanças de todos os campos, o homem o faz sem saber por que, e onde irá acabar; chegando a conclusões, muitas vezes, totalmente diversas daquela em que ele acreditava. Ele assim procede de forma inconsciente, crendo que é ele próprio quem quer e escolhe, enquanto na realidade apenas obedece. A vida deixa ele mascarar tudo com outras razões, deixa-o dizer o que quer, mas na verdade ele só faz o que ela (a vida) permite. O que conta são os fatos e não as palavras. A evolução se faz com as próprias experiências, cada um com as suas. Aprende-se a não mais cair no erros somente depois de ter caído neles e tê-los pagos com as próprias dores. Tudo funciona normalmente; tanto faz ignorar ingenuamente ou mentir com astúcia, enfim, qualquer comportamento pode deslocar a posição do indivíduo, mas permanece inviolável a Lei e a ordem das coisas, que continuam o seu caminho. Assim o homem vai experimentando e com isso conquistando consciência, que é o mais precioso produto de tanto trabalho.

O homem é livre, mas de tudo o que fizer, advirão conseqüências e deverá prestar contas à Lei. Esta o deixa livre para cometer qualquer erro, uma vez que o deve corrigir depois, num experiência instrutiva, porque ensina, com a dor o caminho certo. Trata-se uma conquista de conhecimento, o que significa evolução. O ideal representa um tipo de vida do mais alto nível, isto é, mais civilizado e feliz. É por isso, por constituir um bem maior, que a realização do ideal é assegurada. A vida recompensa somente quem luta para subir, porque isso está de acordo com a Lei, que arrasta consigo quem a segue, ao passo que abandona quem diverge do seu caminho. Se um preguiçoso ou inerte se veste de pacifista para esconder seus defeitos, a vida não se deixa enganar e o não o protege. É inútil mentir-lhe. Diante dela não tem valor tais virtudes baratas, negativas, feitas de inércia. Aqueles que se fazem evangélicos por comodidade são liquidados. A mentira volta-se contra quem a usa, quando é usada contra a vida. A vida quer a luta pela conquista e o ideal é uma luta no mais alto nível, pela conquista de mais altos valores. A hipocrisia, que desejaria usar o Evangelho como um refúgio para poltrões, pode valer no plano humano diante do mundo, mas jamais diante da Lei. É a própria Lei que lança os lobos contra os falsos cordeiros, que quereriam enganá-la. A veste de cordeiro, usada por muito tempo, torna os indivíduos gentis, mas os enfraquece. Obriga-os a assumir as pacíficas atitudes do cordeiro, e isto os torna ineptos para a luta, beneficiando o lobo. No plano humano a vida permite a esses indivíduos agirem desse modo porque isto serve para civilizá-los, mas terminada essa função, manda os aristocratas para a guilhotina das revoluções.

É antiga a história do ideal escondido. O lobo prepara suas reservas, sobe na escala social. Estabilizada legalmente a posição conquistada, ele se torna uma respeitável pessoa honesta; o homem da ordem, defendida por ele porque é sua, torna-se conservador, defensor da sua posição, honesto e generoso porque agora pode agir sem incômodo. Ele chegou limpo ao bem-estar e agrada-lhe completar a obra, ostentando a auréola de benfeitor, situação que agora pode desfrutar para satisfação do próprio orgulho, luxo moral não concedido aos pobres, que ele pode gozá-lo, dada a posição que ocupa, aumentando apenas um pouco ao que já conquistou. Ele tranqüiliza sua consciência, sente-se bom, pratica o Evangelho, dá provas de amar ao próximo, é respeitado na Terra e pode até preparar-se para subir ao céu e gozar a eterna beatitude.

É verdade que ele se esforçou, lutou para subir, pensou, soube vencer. A vida o recompensa com o sucesso terreno, no nível em que trabalhou. Apesar de tudo, ele fez um esforço para subir e a Lei lhe dá crédito. A retidão da Lei é indiscutível, recompensa cada um proporcionalmente ao esforço realizado em sua direção evolutiva. Esta direção é a da própria Lei que atrai e protege o ser. Mas quando este, com a máscara da mentira se põe a desfrutar o resultado obtido, buscando enganar a Lei para ter mais que o merecido, então a falsa virtude se torna nociva para quem a aplica. Não se pode condená-lo, porque se soubesse as conseqüências que o esperam, não escolheria tal via. Sua opção é fruto da ignorância, que se pode chamar também inocência. Mas a inocência não impede que se cometa o mal. Muito ao contrário, leva-o a cometê-lo, e todo o mal deve ser corrigido, porque diante da Lei representa desordem e, sem correção, voltaria a repetir, o que seria prejudicial para quem o comete. Automaticamente, a ignorância leva a experiência que a elimina; experiência necessária para eliminar a ignorância, que, por sua natureza, representa involução, enquanto a Lei quer justamente o contrário, não a estagnação do ingênuo, mas a laboriosa experimentação do conquistador de conhecimento. A inocência não exime das provas, sendo o estado que mais precisa  da escola para aprender. Não se pode voltar ao céu do S situado no mais alto da escala da evolução senão depois de ter atravessado todo o inferno do AS, e por experiência direta, ter atingido os pontos mais degradantes da involução, com o fim de superá-los e suportar o trabalho de purificação, neutralizando todo o mal com que, o ser se confundiu, por ter vivido nele.

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Vimos assim, num determinado aspecto, como funciona a Lei. Ela é um pensamento diretivo e uma vontade de realização. As características fundamentais desta Lei são: a inteligência, o poder, a vontade. Os seus movimentos são exatos e atingem a finalidade. A sua técnica não é aquela incerta da tentativa característica do ser decaído no AS. O homem ainda primitivo, na sua inocência, não soube conceber tal lei senão antropomorficamente, sob a forma de um Deus que ajuda cada um. Quando um corpo cai não podemos admitir que Deus esteja lá para regular o fenômeno da queda, porque este é regulado automaticamente pela lei da gravidade; similarmente devemos admitir que assim ocorra no campo espiritual. A Lei funciona igual para todos, segundo as condições em que cada um se põe diante dela. Esta funciona com inteligência perfeita, sem errar um movimento e falhar um instante, com força irresistível contra a qual não adianta rebelar-se; mas com bondade absoluta, que exige, a qualquer preço, a nossa salvação.

Para esse fim ela usa sempre dois métodos, segundo o tipo de trajetória que o indivíduo escolheu e percorre. Se este se lançou contra a Lei, esta, com seus empurrões, o leva a chocar-se com ela; isso se faz necessário para o bem dele, como única solução, embora dolorosa: a correção do erro, que, de outro modo continuaria a levar o indivíduo, cada vez mais, para o mal, piorando as suas condições.

A Lei o sabe e encaminha para o choque porque, para a salvação do ser, este é o único fato que pode reendireitar sua trajetória. A dor não deve, pois, ser entendida como uma punição por parte de um Deus ofendido, mas como uma benéfica salvação daquele que se queria perder. Mas, se a trajetória em que o indivíduo se lançou segue a direção da Lei, então esta o prende na sua corrente e o eleva. E ajuda-o, se ele esta em fase de correção de uma trajetória errada.

Em suma, a Lei está sempre presente e ativa e visando ao bem, embora sobre formas opostas, segundo a posição positiva ou negativa em que se coloca diante dela. O seres se movem em meio a essa Lei como os peixes no mar. Quem segue a corrente da Lei, é por ela transportado, quem vai contra, é arrastado. Esta corrente é a evolução, dirigida para o S. quem quer andar em sentido oposto, involuindo para o AS, encontra todas as resistências da Lei, até o choque resolutivo, expresso em forma de dor e de um sufocamento da vida. A dor é a voz da Lei que diz: “Erraste, corrige o teu erro”. A Lei nos diz isso, porque é nessa correção que consiste a salvação do ser, o que se chama redenção. Todo caminho da involução não é senão uma trajetória errada, lançada na direção anti-Lei. Neste caso máximo, cada erro nosso, embora pequeno, desencadeia o mesmo processo de experimentação, dor e correção. O caminho evolutivo não é senão a correção do grande erro da revolta, através da experimentação e da dor. Depois de uma cansativa subida que neutraliza a queda, voltaremos ao S, mas conscientes das conseqüências de cada violação da Lei, e com uma sabedoria tão duramente conquistada, que nem se deseja mais cometer o erro. Este é o método que a Lei usa e que se poderia chamar a técnica da salvação.

Procuremos aprofundar o conhecimento dessa técnica, observando-a ainda mais nos seus particulares. Estamos apenas começando a penetrar o canal da Lei, mas, ao percorrê-lo, desde o início, descobrimos incríveis maravilhas. Perguntamo-nos a que coisa esse exame nos poderá levar, e se poderemos ou outros poderão continuar a percorrer aquele canal?

O eixo conceitual em torno de que se move o universo, em outras palavras, o pensamento diretivo do seu constante funcionamento orgânico, é a Lei. Ela representa o seu cérebro, isto é, o modo pelo qual o universo existe no plano mental, do qual dependem outras formas menos evoluídas de sua existência, que estão no nível dinâmico, como a energia e, no nível físico, como a matéria. Com relação ao nosso corpo a Lei é o espírito. No universo, mais ampliado, encontramos o mesmo modelo, de que o homem é uma cópia ou caso menor, com a mesma disciplina, dependência hierárquica e funcionamento orgânico. Como no espírito está o nosso pensamento, assim também na Lei está o pensamento de Deus. E assim como em todo o funcionamento de nosso organismo encontramos a presença de um pensamento, de igual modo a presença do pensamento de Deus é encontrada no funcionamento de todo o universo, e podemos identificá-lo por toda a parte.

Vemos então que o homem é um átomo que se move ao longo de percursos estabelecidos por determinas leis; as que estamos observando. Os seus movimentos podem assumir duas direções  principais, canalizando-se ao longo de dois tipos de trajetória: a que se afasta da Lei, seguindo a direção negativa; e a que segue a Lei, indo, pois, na direção positiva. Este segundo caso se verifica mesmo quando é necessário inverter o percurso para corrigir o precedente afastamento da linha da Lei, realizado em direção negativa. Direção negativa quer dizer avançar no caminho do mal; positiva, quer dizer no caminho do bem. Temos, assim, dois percursos opostos, o da trajetória  que se afasta de Deus pelas vias do mal, e o que vai em direção a Deus pelas vias do bem. Como se vê, o dualismo expresso pelos dois sinais (+ e -), existe em nosso universo até ao mais alto plano da existência, o espiritual.

No centro de tudo está Deus, uno, acima de todo dualismo, que se encontra somente na criatura caída pela revolta. Diante do ser pulverizado no relativo, Deus é o pensamento único e central, a Lei, de que já observamos as qualidades. Vimos que, além da inteligência e bondade, é a Lei também uma vontade absoluta de manter o percurso de todas as trajetórias na direção positiva, no caminho para o S. É vontade de fazer avançar o ser ao longo do caminho da evolução, que é a via natural de salvação. Então, quando uma trajetória se afasta da Lei, porque é lançada na direção negativa, direção do AS, aquela mesma Lei age em sentido corretivo, subtraindo o ser do caminho de involução que é a via da perdição. Ora, das duas forças, a do extraviado e a da Lei, a primeira é mais débil e limitada e deve acabar exaurindo-se; a segunda é mais potente, inexaurível, e deve, pois, acabar vencendo. O impulso atrativo da Lei deve prevalecer sobre o impulso repulsivo do ser. Nesse afastamento está implícito um limite de resistência do impulso negativo, que funciona a favor da vitória do impulso positivo. Inevitavelmente, há de chegar um momento de saturação  do fenômeno, isto é, do exaurimento das forças maléficas do circuito rebelde. Chega-se assim, naquele movimento centrífugo, a um ponto calculável, além do qual dispara, prevalece e entra o impulso oposto, o positivo, um tropismo em direção à Lei, destinado a recolocar as coisas na ordem por ela estabelecida.

É nesse momento que não funciona mais a vontade do indivíduo, mas, com finalidade corretiva deste, prevalece a vontade da Lei. Então se dá marcha a ré e o débito, contraído com os equilíbrios da sua justiça, é pago por quem o contraiu. Nesse momento começa o percurso invertido, o da redenção, então, ao afastamento se substitui a reaproximação; à revolta, a obediência; ao furto de um bem não merecido, o pagamento da pena correspondente. O percurso de ida se resolveu no choque contra a Lei. Pela súbita ruína, o ser compreende o seu significado, e então, para  salvar-se, aceita voltar atrás. Posto na direção positiva, a Lei, sempre saneadora e benéfica, sempre construtiva, por ser positiva, ajuda-o a pagar a dívida. Ajuda porque é boa, mas não presenteia nada, porque é justa. Ela não abandona o pecador ao seu destino, mas o atrai e ajuda para salvá-lo, permitindo, porém, que expie a sua pena, a fim de que compreenda o mal feito e não recaia no erro. O fim é sua salvação e não uma vingança pela ofensa recebida. Deus não pune e muito menos se vinga, porque ninguém tem o poder de ofendê-Lo.

Acontece então, nesta fase, o emborcamento da posição precedente. Enquanto, no trajeto de afastamento, as vantagens eram todas escamoteadas à justiça da Lei  e esta, diante da iniciativa contrária do indivíduo, se encontra em posição de resistência, no trajeto de reaproximação, a dívida é toda paga àquela justiça e o indivíduo, em lugar de impulsos de resistência da parte da Lei, encontra apoio. Isso lhe facilita o caminho, convida-o e impulsiona-o a percorrê-lo, ajudando-o tanto mais quanto mais houver sofrido, quitado, purificado e redimido. Tornou-se assim mais apto a poder gozar dos bens a que tem direito aquele que se move segundo a Lei.

Esta é a técnica funcional dos movimentos e relações de forças entre os dois termos: Lei e indivíduo, e dos deslocamentos de ida e volta por parte do indivíduo em relação à Lei. Esta permanece estável no seu sinal positivo, isenta das oscilações  ( + e - ) do indivíduo, porque ele apenas está sujeito a erros e correções (afastamento e reaproximação). Isso é o que ocorre quando observamos os dois termos, Lei e indivíduo, nas suas relações. Vejamos agora que fenômenos se verificam quando este segue uma trajetória que se move em sentido negativo, anti-Lei. A Lei é positiva; cada afastamento dela é negativo. Esta é a qualidade fundamental daquela trajetória, qualidade exclusivamente sua, característica própria do seu campo de forças. Assim se explica o fato de tal trajetória ser levada, entre as forças que encontra em seu caminho, a atrair, no seu circuito de tipo negativo, somente forças do mesmo gênero, isto é, maléficas, repelindo as outras positivas, isto é, benéficas. Esta é a condenação, que o indivíduo, situado em tais condições, automaticamente, leva consigo e impõe a si mesmo. É dessa forma que ele não pode deixar de encher a sua vida de mal e de desgraças, que tendem a destrui-lo e acabarão por consegui-lo, já que com sua própria natureza negativa antivital, é incapaz de resistir diante da positividade da Lei. No S há uma vontade fundamental de livrar-se do maligno tumor constituído pelo AS, recuperando-se com o retorno ao estado do S.

Estas forças negativas são lançadas também contra os campos de forças de tipo positivo, tentando torcer para o sentido negativo o seu percurso gerado em sentido positivo. Ocorre porém que, sendo esses circuitos de sinal oposto, eles repelem tais forças, de modo que aqueles impulsos de tipo negativo não conseguem penetrar e não são instalados nos circuitos de tipo positivo. Eis porque o mal não pode fazer o mal a um bom que não o mereça, mas pode acrescentar o mal a quem o merece, somando-se a ele, porque, neste caso, são-lhe abertas as portas para entrar, em vez de fechá-las para impedi-lo. Ocorrem então dois fatos: o mal lançado não entra no campo do bem, que é automaticamente protegido pela sua positividade; ele volta-se para trás e, sendo negativo, vai enriquecer o campo do seu próprio sinal negativo, aumentando o dano de quem o lançou. Assim, os impulsos negativos além de não penetrarem no circuito positivo, somam-se com os impulsos negativos do circuito de origem, reforçando-se a potência destrutiva que redunda em prejuízo de quem a possui.

De tais constatações deriva uma moral que responde à perfeita justiça da Lei, razão pela qual, por mais que se tente fazer o contrário, não é possível fazer o mal senão a si mesmo, nem fazê-lo a um bom que o não tenha merecido. A medida com que o mal pode passar de um indivíduo a outro e a negatividade a ser inserida num dado circuito, é estabelecida pelo mal merecido, grau de negatividade de que se saturou o próprio circuito receptor. Em suma, a Lei não permite a injustiça, nem que se sofra sem culpa, porque não há sentido em corrigir um erro não cometido. Logo se pode verificar a injustiça de que ao ser mau seja concedido o poder de fazer sofrer o bom e inocente, somente porque aquele malvado é mais forte e mais esperto. Se o bom tiver de ser atingido, isso só poderá ocorrer na proporção em que o circuito de suas forças permitir a introdução de impulsos negativos e maléficos. Tal moral nos garante que essa inserção não será possível quando o indivíduo bom não tiver merecido o mal que o assalta, mas se torna possível desde que o mereça. Diz-nos também que aquele mal não merecido e, pois, não recebido, não é uma força que se anula, o que é impossível, mas uma força que se volta contra, e atinge aquele que a lançou. Esta é a justiça da Lei. Vemos em superfície, porque desconhecermos as raízes profundas e as origens longínquas de tantos acontecimentos humanos que pode enganar-nos.

O contrário ocorre no caso de trajetórias que seguem a direção da Lei, isto é, um percurso em sentido positivo. Estas, entre tantas forças que encontram em seu caminho, atrairão e poderão absorver no seu circuito apenas aquelas que têm o mesmo sinal positivo. Assim, que se encontra em tais condições, terá uma vida abençoada e frutificante, que o levará para o alto, porque a Lei da vida, para quem quer evoluir, é mover-se em direção do S.

Se tais impulsos positivos forem, porém, dirigidos para campos de forças de tipo negativo, essas forças positivas não poderão ser inseridas naquele circuito de sinal oposto, sendo, pois, repelidas. Assim o bom não pode fazer o bem a um mau que o não haja merecido, e, quando pode fazê-lo, isso só acontece na medida em que este o mereceu. Quando esse bem não pode entrar, porque encontra as portas fechadas, então ele volta para trás e retorna ao circuito de forças positivas do emissor, enriquecendo-o de positividade; vantagem para quem fez o bem.

A moral que deriva de tais constatações é a mesma exposta acima, mas com resultados opostos, permanecendo de pé a justiça da Lei. Como se vê, esta nova moral se baseia neste princípio de justiça, mais avançado que o da antiga moral, que tudo explicava sob a perspectiva da ofensa a Deus e de uma ação pessoal punitiva contra o transgressor. Tal conceito, que tem muito de egoísmo e de vingança, corresponde a forma mental e psicológica do passado, situado ao nível de uma mitologia antropomórfica proporcional à ignorância dos tempos. Porém, enquanto aquela velha imagem de Deus convier à vida, ela vai ser respeitada, apesar de bastante primitiva. Ser destrutivo é trabalho negativo característico dos atrasados, inseridos no AS. Quem é positivo não faz jamais um trabalho negativo, mas somente o positivo de mostrar a nova visão das coisas, pondo-a junto à antiga, de modo que os mais amadurecidos a encontrem pronta e possam escolhê-la e pô-la em atuação. A destruição do antigo compete ao tempo, superando-o e deixando-o morrer de morte natural.

Traçaram-se aqui as espirais de luz, premissas introdutivas, suscetíveis de grandes desenvolvimentos, de uma nova moral científica e racional, universal, porque verdadeira para todos, como verdadeiras são as leis do plano físico e dinâmico. Assim, para os ateus como para os crentes, não há uma moral diferente, como não há uma lei de gravidade diferente. O lançamento das trajetórias é livre, mas para todos em qualquer tempo e lugar, cada movimento é regulado por leis e, apenas iniciado, é canalizado em um dado sentido, a que fica ligado segundo as direções  que lhe são imprimidas, permanecendo prisioneiro da disciplina da ordem soberana, e não podendo escapar do canal escolhido até que a sua trajetória seja toda percorrida. As transgressões levam ao choque destrutivo e doloroso com que se paga o erro.

Essa nova moral não será aceita por quem está habituado à velha moral. Porém, para o homem mais evoluído, representa uma grande satisfação chegar a conceber com exatidão essa lei e poder-se situar e funcionar no seio, isto é, num plano de justiça mais alto do que o humano plano da luta pela seleção do mais forte e astuto. Para o evoluído, é consolo constatar de modo positivo que, no nível mais avançado, existe também uma lei bem diferente daquela de tipo animal vigente em nosso mundo. Esta, com a sua relativa moral e sistema de vida, permanece com herança somente para o involuído, destinada a desaparecer com a evolução. Surge uma biologia mais avançada, em que, à feroz lei do mais forte se substitui a justa lei do mais honesto, de modo que a seleção ocorra em outro sentido, num nível mais alto. Será introduzido na Terra, inclusive para os menos atrasados, e poderá  começar a ser reconhecido o valor social de quem é mais avançado. Não mais se condenará o inepto o tipo dominante inferior de vida. Assim o evoluído conhece qual é a sua posição biológica e cada um está situado no lugar que lhe cabe por justiça, em obediência à lei do seu plano de evolução

Encontra-se finalmente um ponto, uma posição biológica, em que se permite ao ideal cumprir sua função vital, em vez de ser utilizado de modo hipócrita, como meio de esconder a realidade e obter melhor vitória na feroz luta pela vida. Finalmente, alcançar-se-á uma posição biológica situada, além do nível normal humano, num nível mais elevado, em que o ideal seja realizado e atuante, não só como teoria e hipocrisia. Definir-se-á, finalmente, na escala biológica, um lugar em que o evoluído se encontre no ambiente que seja adequado ao seu tipo feito de inteligência e de bondade e não de força e agressividade, reconhecendo-se-lhe o direito à vida.

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Resumamos e apliquemos estes conceitos ao momento histórico atual. Há na Terra três modos de viver, usando três métodos: 1º) O da força, que consiste na opressão do fraco; 2º) O da astúcia, apoiado na inocência do ignorante; 3º) O da sinceridade e clareza, dirigido à compreensão recíproca com fim de colaborar.

Estes três métodos são distribuídos em três degraus sucessivos ao longo da escala da evolução. O primeiro é o mais antigo, hoje superado e condenado. O segundo é de uso mais recente e ainda em vigor. O terceiro é um método mais inteligente, que se expandirá no futuro. Hoje vivemos uma fase de transição, que vai do segundo ao terceiro método.

É natural que, no passado, quando a vida se encontrava diante de um fraco ou ignorante, pela lei do mínimo esforço e maior rendimento, permitisse que quem tivesse capacidade de consegui-lo, dela se valesse. Embora muitos pensem dessa forma, o método é injusto, segundo a atual e mais amadurecida moral dos países civilizados, ao passo que poderia parecer justo no passado menos evoluído. Outrora não existiam problemas de justiça com deveres e direitos, mas só duas posições: a do vencedor, o forte que comandava, e a do vencido, o fraco que obedecia. A primeira coisa que fazia aquele que detinha o poder, para assegurar-lhe a continuação  e consolidá-lo, exercia-o em nome da justiça divina, afirmando a sua legitimidade; que se defendia à força, com as armas da sugestão e do domínio psicológico. Pregavam-se como virtudes o respeito e a obediência, investindo o poder de um caráter sagrado, coadjuvados pela autoridade religiosa, aliada ao trabalho de manter subjugados os povos. É natural que, em tal fase evolutiva ainda feroz, a mais forte preocupação de quem detinha o poder fosse conservá-lo, defendendo a própria posição.

Do outro lado, o pobre não vencedor era induzido a permanecer sujeito, não só a um tal tipo de educação, que lhe era imposto, mas também uma natural idéia de superioridade do mais forte. Tal tipo, que para Nietzche representava o modelo do super-homem, estava, porém, naquele baixo nível de evolução em que a humanidade se encontrava no passado, pelo uso das velhas leis biológicas, baseadas na força, na superioridade, no maior valor – valendo-se, naquele plano, das mesmas razões pela quais o leão é o rei da floresta, e merece respeito. Essa superioridade não era, pois, só inculcada por sugestão, mas sentida realmente pelos fracos.

Hoje em outra fase da evolução, tudo isso não é mais considerado justo, como no passado. É natural que a moral dependa das diversas condições de vida. No passado se tinha um outro conceito de justiça, porque era medido em função de outros pontos de referência. Não há dúvida de que, se o mais forte não representava um maior valor espiritual, constituía, no entanto, um maior valor biológico. É por isso que o pobre se inclina diante do rico, ainda que com ódio e inveja, mas também com admiração e avidez em imitá-lo, ansioso de aprender os métodos de vitória. Para a vida isso é sadio, porque funciona com a evolução, embora em nível baixo. O pobre sabia que era um fraco, que valia pouco. Sabia que a sugestão era justa, e que ele devia aceitá-la por culpa própria. Era sua fraqueza, que ele não sabia superar, que o impedia de ter direitos. De fato, ele se deu conta de tê-los só agora quando está mais evoluído e já conquistou a força para fazê-los valer, sem a qual é inútil ter direitos, embora justos. Antes não lhe restava senão a virtude da obediência e resignação e, consolo do vencido na Terra, a esperança de recompensa com uma vida melhor nos céus.

É óbvio que, naquelas condições de vida miserável, era impraticável ao pobre o exercício da bondade. Pode-se pensar nos outros somente quando não se falta o indispensável para si mesmo. Para poder ampliar-se, é preciso que não falte o necessário; para poder dar, é preciso  primeiro possuir; para sermos generosos, precisamos ser fortes; para poder beneficiar, é preciso sermos ricos. É preciso não sermos mais inocentes para podermo-nos permitir o luxo de sermos bons sem cair em todas as armadilhas da vida. Os deveres dizem respeito àqueles que os podem cumprir. Porém isto não significa que hoje o pobre esteja passando para a outra margem; ele tem de assumir suas responsabilidades. As previdências sociais dão uma nova orientação de tipo coletivo. As classes e os povos, outrora em estado de sujeição, estão se organizando, vão conquistando forças e se fazem valer. É suficiente este fato que nada tem de teológico, filosófico ou moral, para chegar-se a um novo conceito de justiça, antes impraticável. Hoje podemos constatar como fortalecer-se com base no direito que realmente se tem, fazendo surgi-lo, quando era apenas teórico e não funcionava na prática. Entretanto, um fato nada espiritual, mas concreto, com o a aquisição da força, pode transformar a velha moral numa outra tão diversa.

 A atual transformação nos faz ver como a vida tinha suas razões, quando, no passado, deixava que aquelas injustiças fossem cometidas, porque isso ocorria somente até o momento em que o fraco, sofrendo, aprendia a tornar-se forte; e o ignorante, a tornar-se mais inteligente, isto é, até o momento em que a vítima alissaje de si mesma o defeito que a tornava vulnerável. Assim a vida atingia a justiça percorrendo uma longa estrada, mas a única possível, permitida pelas condições de então. Na verdade, para livrar-se dos próprios sofrimentos, a vida obrigava os mais atrasados a fazer o esforço de evoluir, superando suas inferioridades na luta pela seleção do melhor, sendo justo essa ocorrência. Depois, nas revoluções, as vítimas se revoltassem contra os opressores, fazendo com que estes pagassem as próprias culpas, o que é também um ato de justiça. Vê-se como tudo é lógico e tem suas razões.

 Cada um paga pelos seus defeitos: o fraco ou ignorante, pela sua fraqueza ou ignorância; o forte ou astuto, pelo abuso da sua vitória, e todos, indistintamente, cursando a mesma escola, alternativamente, são obrigados a evoluir como quer a Lei. Assim, cada um sofre um período, enquanto o outro goza; e goza um período enquanto o outro sofre. Na escola da Lei há lugar para todos. Esta era a única forma de justiça que se podia praticar num regime de inimizade, onde a justiça não pode ser obtida sob a forma pacífica de concordata entre companheiros, mas somente através do equilíbrio entre rivais em luta.

 Por mais que se busque escondê-la sob belas teorias, esta é a realidade da vida. Vejamo-lo num outro caso, também de justiça, mas noutro sentido. Hoje nasceu um fato novo na história, isto é, um estilo de generosidade, pelo qual as classes ricas se ocupam das pobres; os povos de alto nível econômico, daqueles subdesenvolvidos. As raízes de tudo isso se encontram num outro fato também novo: é que o comunismo organizou os pobres e estes se tornaram uma força e então tornando-se fortes, têm direitos que antes não tinham e que agora o têm pelo fato de que hoje sabem fazê-los valer. Um direito não alimentado de força que lhe imponha o reconhecimento, na prática não é direito, é só um piedoso desejo, cuja satisfação depende do capricho do patrão. Hoje já se pode falar tanto de justiça social, porque existem os que estão prontos a exigir seu reconhecimento, enquanto antes ninguém se ocupava disso. Somente agora os pobres tornaram uma ameaça, e então, nas classes e nos povos abastados, nasceu o amor pelos deserdados, se ressuscitou o Evangelho. E no entanto há séculos já se falava desses deveres para todos os cristãos, mas que só excepcionalmente os praticavam. Entretanto como se podia pretender o contrário, se a parte oposta não sabia impor-se, fazendo reconhecer os próprios direitos?

 Hoje, o grande amor pelo pobre se tornou moda, é usado como bandeira, como se o pobre tivesse surgido só agora, como se não tivesse existido antes e não tivesse sofrido. O mundo se deu conta de sua existência somente hoje, depois que o pobre constitui um perigo, sem o que ninguém o veria. Até ontem seus direitos não existiam, seu problema não tinha importância, se hoje existe é porque se tornou o problema do rico, isto é, da sua segurança e da sua paz. Foi daí que surgiu esse novo amor, não por questão de bondade, mas de luta.

 Ora, para que acobertar-se com mantos de idealismo, se essa é a realidade da vida e em tais disfarces ninguém crê? Por que insistir no velho método da astúcia, enquanto o mundo quer passar – não porque esteja melhor, mas porque está mais inteligente – ao método da sinceridade e clareza? A ingenuidade está em crer que os velhos sistemas possam ainda valer num mundo que se renova profundamente; está em crer que um determinado tipo de trajetória, constituído por um modo de pensar e de viver, se possa rapidamente corrigir só com a tomada de consciência de tudo isso. A quem conheceu a técnica desses fenômenos, explicada neste volume, poderá vir à mente esta pergunta: não será muito tarde para que uma trajetória, percorrida por tanto tempo no passado e fixada como forma mental e costume social, possa ser corrigida com tais paliativos? Não estará implícito nos equilíbrios da Lei, sendo portanto fatal, que não se poderá chegar àquela correção, senão depois de ter sofrido o choque com aquela Lei e todas as suas conseqüências?

 Num regime de luta, pode surgir a dúvida de que no passado tenha sido exaltada a virtude da inocência, porque essa significava ignorância, que permite melhor dominar, ao passo que a vida quer e premia a virtude do conhecimento, necessária para vencer a luta sem cair na armadilha da astúcia humana. Com a queda, perdeu-se aquele conhecimento que vai sendo trabalhosamente reencontrado através da experimentação – e nessa conquista consiste a solução. Vimos como se procede à correção do erro devido à ignorância. Por isso a vida é um contínuo experimentar, justamente porque o seu fim é a reconquista do conhecimento. Assim se explica o instinto humano de aventurar-se em toda a sorte de experiências.

 Muda então o tradicional conceito de evoluído. Ele não é um santo, um anjo, ingênuo e inexperiente, mas um ser que provou e conhece a vida, mesmo nos seus planos mais baixos, de que, porém, fez o esforço de emergir. A superioridade deve ter consciência também do seu oposto, pois, deve ser o fruto de um conhecimento adquirido pela experiência indivíduo. Assim o santo deve conhecer todas as insídias do diabo, porque, se for ingênuo, será vencido por ele. Trata-se uma guerra e o santo deve ser o mais forte e o mais preparado. O evoluído deve conhecer as conseqüências do erro por tê-lo cometido, se não quiser recair nele. Deve ter- se livrado, com seu esforço, da grande punição que o ser infligiu a si mesmo com a queda do AS, isto é, no estado de ignorância da realidade expressa pela Lei. O involuído vive em posição invertida, isto é, no engano, na ilusão que foi chamada a “Grande Maya”. Ele é cego, mas crê que vê, e assim se engana e paga. Enquanto não houver corrigido a sua posição de AS, não terá paz.

 Deus entende o pensamento de Satanás mas Satanás não entende o pensamento de Deus. A evolução consiste na reabsorção do erro pela dor, do pecado pela penitência, da ignorância pela experiência, do negativo pelo positivo. A evolução é o trabalho de correção, na direção do S, isto é, Deus, da trajetória da vida invertida em direção ao AS. Isso só se obtém com uma serie de tantos lançamentos de trajetórias menores quantas são as vidas, as experiências de superação e as lições a aprender. As condições são desvantajosas porque o lançamento se faz na posição de AS, isto é, emborcado para o negativo. Pelo o fato de os impulsos serem errados, há a necessária de corrigi-los um a um.

 Vejamos o que está sucedendo hoje, que se está realizando a passagem do segundo ao terceiro momento, isto é, do método da astúcia e do engano para aquele da sinceridade e compreensão. Vivemos numa fase de destruição dos valores do passado. Com ela não se entra mais em discussão. Quer-se apenas retirá-lo do mundo para recomeçar de zero. O castelo das velhas construções não comanda mais a crítica. Há porém o fato de que, no transformismo universal, nada pode deter definitivamente. No conflito entre as gerações, às novas, terminada a destruição, cabe-lhes a tarefa de recomeçar a reconstruir, porque não se vive no vazio e ninguém pode parar a vida. Que saberão fazer os inovadores de hoje quando, superada a fase negativa da destruição, tiverem que entrar na subsequente e positiva fase de reconstrução?

 Não há dúvida de que estamos em estado de revolução. A história nos habituou com a idéia de revoluções à base de catástrofes. Esta, porém, parece uma revolução mais evoluída, que se processa diferentemente. Nem por isso se pode dizer que não seja revolução, porque o é, de uma forma mais profundas que as outras. Hoje se depõe reis e chefes que o eram, outrora, pela graça de Deus e vontade da nação, mandando-os retirar-se sem matá-los, coisa antes inconcebível. Esta forma de revolução mais civilizada parece-nos mais sadia, construtiva na ordem, e não o habitual desabafo de vinganças e de agressividade por parte dos oprimidos. Trata-se de uma revolução que aceita a destruição como um mal necessário para limpar o terreno, cuja finalidade não é negativa, mas antes positiva, porque se trata de construir num plano mais alto, de acordo com a lei da evolução. Essa forma que em nosso Ocidente civilizado é pacífica nada retira à profundidade do fenômeno, que poderíamos chamar biológico, porque é transpassado de fase evolutiva, tocando, portanto, os pontos vitais da humanidade, dirigindo-a no sentido de um mais avançado tipo de civilização. Não estamos tratando da habitual revolução de classe, o assalto dos famintos contra os abastados. É um processo que procura desenvolver a inteligência até que se compreenda que peso representa para todos tal método de vida. É, pois, uma revolução de libertação da segunda fase, liberação das falsidades, que enchem a vida de alçapões. É uma guerra contra a moral de hipocrisia, produto do passado em todos os campos, que se transformou em sistema de vida, de que tanto se aproveitou quem a usou e que tanto pesou sobre quem a sofreu. Um hábil homem de negócios dizia a filho para educá-lo: “Conviva sempre com as pessoas honestas, são as mais fáceis de serem enganadas”. Eis o que se lucrava com a honestidade.

 O problema agora é reconstruir. Jamais teve tanto vigor o revisionismo como neste nosso tempo de ideologias. Os jovens precisam de quem, especializados em tais trabalhos, tenha preparado e possa apresentar um plano já completo. Têm necessidade de encontrar um filosofia já feita, positiva, com que se orientar e dirigir a ação. A hora atual não é mais de elucubrações, mas de realizações. Vivemos num momento maravilhoso da história humana, que é o de aceleração evolutiva, isto é, de um transformismo mais rápido em sentido ascensional da vida, para formas mais evoluídas. Agora sabemos que determinados conceitos novos não nascem por acaso em algumas consciências isoladas, mas que representam o reclamo das exigências do momento evolutivo, que se polariza, sobre aquelas consciências porque satisfazem uma necessidade vital, encontrando, no inconsciente coletivo o terreno adequado para vingar e frutificar. Eis que, entre tantas, nossa Obra, da qual este volume faz parte, poderia ser utilizada para esse fim. O momento é adequado. A oferta é desinteressada, e já foi feita em 1966, oficialmente, até na Câmara dos Deputados, em Brasília, ao Brasil e aos povos da América Latina. Esta Obra não nasceu hoje. Ela está completando agora, depois de quarenta anos de trabalho; tem suas raízes no passado e se projeta no futuro, do qual representa uma antecipação. Pode assim funcionar como ponte entre a segunda e a terceira fase do transformismo evolutivo. Ele não destrói, como hoje se desejaria; ao contrário, salva e utiliza do passado tudo o que é bom e que não é novo, mas alija tudo o que é mau, enquanto se amplia para frente, com conceitos novos, lucidez, sinceridade, como exigem os tempos atuais. Trata-se de conceitos revolucionários, enquadrados na ordem da Lei de Deus, exposta com lógica e demonstrada à razão através de provas.

 A fim de que uma coisa se desenvolva, não basta que seja boa e bela. É necessária que seja também útil, satisfaça uma necessidade do consumidor, que só então a aceita. Tal Obra é um plano de trabalho para os reconstrutores. Ela é publicada em livros que são de domínio público. As novas gerações aí encontram, com o estilo de franqueza que desejam, a solução racional dos fundamentais problema do conhecimento. Trata-se de conceitos sadios e dinâmicos, de uma idéia que não se impõe, mas se oferece pelas vias da convicção sem agredir ninguém; uma idéia jamais negativa exclusivamente reconstrutora, deixando a outros a parte destrutiva. Trata-se de conceitos que induzem os seguidores do velho estilo a um exame de consciência, e os jovens seguidores do novo estilo a uma conquista de consciência. Os primeiros. Para que mudem o sistema diretivo, os outros, a fim de que assuma a responsabilidade de posições que querem conquistar. O mundo está farto de enganos, exploração e injustiças, de pessoas que se tornam pesadas à coletividade porque dela tomam mais do que dão, e assim a danificam, porque ainda não compreenderam quanto infortúnio causam a todos, e não somente a elas próprias. Por serem desonestas e injustas em qualquer campo, provocam as que são honestas e justas. Trata-se de verdades positivas, separadas, calculadas nos efeitos, racionalmente controladas e suscetíveis de experimentação, verdadeiras tanto no Oriente como no Ocidente, sob qualquer religião ou ideologia, porque estão escritas nas leis da vida e, como tais, por toda a parte as vemos funcionar.

 Os mais evoluídos já começam a compreender que o sistema intimidatório não resolve, e a violência provoca outro dano. Hoje se pode demonstrar a quem sabe compreender quanto aflição deve suportar pelo mal feito o mesmo indivíduo que o faz. Pode-se demonstrar que o dano recai principalmente sobre ele, que a mentira engana quem a pratica e isso automaticamente, por um jogo de forças que não se podem deter e das quais não se pode fugir. Entende-se, pois, que é estúpido aquele que pensa vencer com tais meios, porque em lugar de ganhar, como crê, perde e paga.

 O novo mundo a construir deve ser, antes de tudo, sadio. Isto é o que a vida quer. Se se deseja a tão cobiçada justiça, para poder usá-la como um legítimo direito, é preciso antes praticá-la como legítimo dever. Só assim pode cessar o estado de luta que atormenta tantos. Trata-se de uma renovação de base. O problema da injustiça tem solução, mas a humanidade está ligada aos. antigos hábitos. Terão as novas gerações a força de arrastá-la até à outra margem? Conseguirá o homem compreender a estupidez de querer sofrer inexoravelmente, fazendo da Terra um inferno de condenados, atormentando-se reciprocamente, enquanto tudo isso poderia ser evitado e estarem todos melhor, se fossem menos maus? Trata-se de passar da era do patrão-servo, em que se usavam os primeiros dois métodos, força ou astúcia, que se escudavam na injustiça, à era de direitos e deveres, em que se usa o terceiro método, o da sinceridade e honestidade, que se alicerça na justiça. O momento é grave e comprometedor. Trata-se de mudança de fase evolutiva, do salto de um nível biológico a outro mais alto. Quem está habituado aos velhos sistemas resiste. Mas se as novas gerações souberem ser fortes, inteligentes e honestas, haverão de consegui-lo e então poderão dizer que fundaram uma nova civilização.