Essa evolução, cujo maravilhoso caminho estamos observando, é produzida, em seu aspecto conceptual, por uma transformação de princípios e de leis. As formas do ser, como as encontrais em todos os níveis (γ,  β, α) são simplesmente a expressão desse pensamento em contínua ascensão. Na reconstrução desse pensamento, que atingis mediante a análise e a observação, está a síntese máxima que resume o mistério da criação. Por isso, melhor que nos entretermos no estudo das formas orgânicas - fenômeno que conheceis porque exterior e mais imediatamente acessível - é insistir na compreensão dos princípios que as determinam e regem o transformismo, isto é, o estudo das causas, mais do que os efeitos.

 Comecemos, pois, pelo que é prevalentemente o aspecto conceptual dos fenômenos biológicos, o princípio diretor em sua ascensão, para depois observar o aspecto dinâmico do devenir das formas em que se exprime a ascensão desse princípio. O aspecto estático das individuações orgânicas está suficientemente expresso por vossas categorias botânicas e zoológicas e pelo princípio evolucionista, darwiniano das formas, já conhecido.

 Nesses três aspectos, como nas fases precedentes, esgota-se o estudo da fase ALFA. Na realidade, estão fundidos juntos, presentes em qualquer gênero e a qualquer momento, como cada pensamento está fundido na veste que o manifesta; assim vos aparecem na história do desenvolvimento ontogenético e filogenético (embriologia-metamorfologia e genealogia da espécie). Só compreendereis isso se o considerais como desenvolvimento mais de princípio que de formas, de psiquismo que de órgãos.

 Por tudo o que dissemos sobre a teoria dos movimentos vorticosos e sobre a lei biológica da renovação, o movimento ou princípio cinético da substância torna-se cada vez mais intenso e manifesto e guia-nos às portas da terceira fase, α, com um conceito fundamental: o metabolismo. Vimos a sua íntima estrutura. Metabolismo, fato desconhecido em γ e em β, fato novo, que significa ritmo acelerado de evolução. Vimos que os movimentos vorticosos contêm, em germe, todas as leis biológicas. O princípio básico da indestrutibilidade da substância torna-se, na vida, instinto de conservação; o princípio de seu transformismo ascencional torna-se lei de luta. A vida manifesta-se desde seu primeiro aparecimento com a característica fundamental de atividade, de luta pela conservação. Esse princípio logo se divide em dois: conservação do indivíduo e conservação da espécie, a que presidem duas funções básicas: nutrição e reprodução.

 Há uma linguagem comum a todos os seres vivos, que todos compreendem: a fome e o amor. Mesmo na reprodução por cissiparidade, há uma doação de si, há o germe de um altruísmo a favor da espécie. A vida aparece imediatamente, desde suas primeiras formas, com a marca de ilimitado egoísmo; este somente cede lugar a um egoísmo diferente, o individual que apenas faz concessões ao coletivo. Trata-se de leis férreas, ferozes em seus primórdios, mas sempre equilibradas em perfeita justiça. No íntimo do fenômeno existe, como vimos, o princípio de todos os futuros desenvolvimentos e das mais altas ascensões. O embate e o equilíbrio das forças do mundo dinâmico tornar-se-ão dor e justiça nos níveis mais elevados. Conservar-se é o mais premente e sempre presente esforço da vida. Tesouros de sabedoria são dissipados, todas as astúcias, os meios mais poderosos, todos os sistemas e os mais diferentes estilos são empregados, contanto que se alcance esse objetivo. Dever supremo a que não podeis escapar, mesmo que quisésseis ficar ocioso; o instinto de conservação vos defende do suicídio, dando-vos o medo da morte.

 Compreendei, porém, que se a conservação é necessidade inviolável, não pode, sozinha, constituir o fim último, porque é absurdo um ciclo fechado e estacionário de finalidade, uma vida que só tenha como meta a autoconservação. A vida não é fim em si mesma, mas meio para um objetivo mais alto: evoluir. Evoluir significa progredir na alegria, no bem; significa libertação das formas inferiores de existência, realização progressiva do pensamento de Deus: meta suprema que vos revela por que o fenômeno da vida está tão ciosamente protegido por leis sábias. Refleti que nela se quer, supremamente, vossa felicidade, e elevai um hino de gratidão ao Criador.

 Eis o novo instinto universal e insuprimível: a necessidade de progresso e a insaciabilidade do desejo. O próprio hábito da satisfação, pela lei dos contrastes, base da percepção, ao diminuir a alegria, acentua a insaciável  necessidade de progresso. A Lei contém em si todos os elementos do desenvolvimento futuro. Longo caminho evolutivo reunirá os germes das leis biológicas contidas nos movimentos vorticosos, com as mais altas leis da ética e das religiões. As formas primordiais evoluem. O princípio originário subsiste tenazmente, inviolável, superior a todas as infinitas resistências do ambiente que sempre o obstaculizam e nessa resistência ele se tempera. A lei baixa e feroz requinta-se. Fome e amor - primeira expressão da lei da luta pela conservação - tornar-se-ão mais tarde, através das duas formas de atividades que impõem ao ser (isto é, trabalho e afetos) duas qualidades elevadas e poderosas: inteligência e coração, que governam, nos níveis humanos mais altos, a conservação individual e coletiva. A função cria o órgão também no campo psíquico, ou seja, hábitos e qualidades. Surge imperceptivelmente, com o exercício, a nova característica que, afinal, estabiliza-se com nitidez.

Assim, a evolução fixa gradualmente suas conquistas; desenvolvendo seus princípios, diferenciando-os e multiplicando-os por diferenciação, opera no mundo dos efeitos uma verdadeira criação. Mas, é sempre o absoluto que se manifesta no relativo, a causa única que se multiplica em seus efeitos. Nascerão, assim, órgãos e instintos, funções novas e novas capacidades. Do primordial funcionamento orgânico, do simples princípio de permuta, subir-se-á até as mais complexas formas de psiquismo do espírito humano. Então aparecerá, por evolução, como elemento substancial na economia da vida, aquele absurdo biológico, o altruísmo. A lei que regula a vida assume uma forma de expressão mais elevada ou mais baixa, de acordo com o grau do ser; revela-se na medida que corresponde à potencialidade conquistada por ele. A evolução torna cada vez mais transparente, na vida, um pensamento cada vez mais alto e transforma as leis biológicas.

 Jamais vos perguntastes o significado do contraste tão evidente entre a lei sem piedade da luta e a lei humana mais doce, da compaixão, bondade e altruísmo? O próprio animal conhece a compaixão, mas só para si e para seus filhos. Afora esses casos, a luta é feroz, sem exceções. O esforço da evolução se realiza mediante uma seleção implacável e o triunfo cabe, incondicionalmente, ao mais forte. No homem, os objetivos da seleção são alcançados por outros meios, pelo trabalho, pela inteligência, pelos sentimentos. Só no homem surgem essas superações e a percepção do contraste com a lei mais baixa.

 O animal ignora essas formas superiores e é atroz, sem piedade, indiferente à dor do vizinho, mas em perfeita inocência; não por maldade, mas em plena justiça, porque esse é seu nível e sua lei. O equilíbrio na consciência animal é mais mecânico, simples e primitivo; ressente-se mais fortemente das origens e ainda aparece como uma resultante de forças, sendo mais facilmente calculável em sua simplicidade do que na complexidade do espírito humano.

 Nas mesmas circunstâncias, o ser humano comporta-se com liberdade de escolha e independência pessoal, ignoradas no mundo animal, justamente porque em seu campo entram em função elementos desconhecidos nos níveis inferiores. Observai em que rede de forças e de princípios se movem as formas; observai que imensas criações pode produzir um mero desenvolvimento de princípios. Só o homem olha para trás e pela primeira vez percebe a distância que o separa do passado, dele se horroriza porque se encontra no limiar do mais alto psiquismo, representando a forma de transição entre a animalidade e a super-humanidade, entre a ferocidade e a bondade, entre a força e a justiça. Duas leis contíguas e, no entanto, profundamente diferentes. O homem oscila entre dois mundos: O mundo animal que diz: ou comer ou ser comido, agressão, força brutal, luta sem piedade, triunfo incondicional do mais forte, pois a força física sintetiza toda a vitória nesse nível; e o mundo superior, anunciado pelo Evangelho do Cristo, a Boa-Nova, a primeira centelha da maior revolução biológica em vosso planeta.

 Em meu conceito, fenômeno psíquico e social é fenômeno biológico, porque sempre reconduzido à sua substância, lei da vida. Neste novo mundo, a força torna-se justiça. Somente o homem, finalmente amadurecido, pode compreender esta antecipação de realizações biológicas, reveladas pelo céu. Jamais, desde o aparecimento da vida até o homem, fora iniciada mais profunda transformação, porque a vida animal é, apenas, uma vida vegetal mais acelerada e lhe conserva os princípios fundamentais. A lei do amor e do perdão constitui tamanha revolução substancial, que o animal não pode ficar excluído dela; diante de tão grande desenvolvimento dos princípios da vida, o ser inferior - em que tantas vezes o homem regride - pára, como diante de muralha insuperável. Esses conceitos são verdadeiramente, nesse nível, um absurdo, uma impossibilidade; direi mais, são uma impotência biológica.

 Veremos como ocorre, por um sistema de reações naturais e de registros destas na consciência, por progressiva aproximação e disciplina da força desordenada, a transformação da lei do mais forte, na lei do mais justo; da lei desapiedada da seleção, na lei do amor. A lei do Evangelho não é um absurdo em vosso nível biológico; não é aquilo que, visto de níveis mais baixos, pode parecer fraqueza e falência. Nesta fase mais alta de evolução, o vencido da vida animal pode ser um vitorioso, porque outras forças, ignoradas naquela vida, são atraídas e postas em ação. Aparece o mundo moral, que supera, vence e reprime o mundo orgânico, arrastando-o e dominando-o em esferas superiores. Em qualquer caso, a inconcebível fraqueza da bondade, a deposição de todas as armas - base da luta pela vida - o altruísmo para qualquer ser, sobretudo para com o inimigo, transforma-se em novo princípio de convivência e de colaboração, a lei do homem que se eleva a outra unidade coletiva mais alta, que se organiza em nações, sociedades, humanidades. Os homens que praticam (não os que pregam) esses princípios, ainda são poucos e incompreendidos. Mas aumentarão e só a eles pertence o futuro.

 Mais perfeita manifesta-se a lei  à proporção que as unidades menores se diferenciam e se organizam em unidades mais amplas. Cabe ao homem transformar a natureza. Direi melhor: ele mesmo é a natureza e nele a natureza se transforma. Compete ao homem, mudando-se a si mesmo, realizar a transformação da lei biológica em seu planeta; realizar, fixando, nas formas psíquicas, estas criações superiores da evolução.

 Cabe ao homem o dever e a glória de responder ao grande apelo descido dos céus para o ser mais escolhido e para o produto mais elevado da vida terrestre, para que se cumpra o trabalho de transformar a natureza que ignora a compaixão, numa natureza movida por uma lei superior de amor, de fusão, de colaboração, de compreensão, de fraternidade.