Falamos no primeiro capítulo do princípio de retidão sobre o qual se baseia a Lei. Ele corresponde a um princípio de equilíbrio e justiça que faz parte da ordem de que é feita a Lei. Vimos, então, que existe este outro método de conceber e conduzir a vida. Podemos agora perguntar-nos: para vencer, ter sucesso e resolver o problema da sobrevivência há somente o método em vigência em nosso mundo, o de ser o mais forte ou hábil para triunfar na vida, ou existe, na verdade, também outro método? Qual é a sua técnica, e a que resultados ele nos leva? Aquilo que dissemos até aqui sobre a Lei e a sua retidão, pode levar-nos à dúvida de que o outro método possa ser mais lucrativo. Ele é o honesto, meritório, consiste na posse de um valor real, mais útil do que o de impor-se à força. Seria revolucionário admitir que o sistema da justiça, e conseqüente defesa automática no indivíduo por parte da Lei, possa substituir com vantagem o da justiça feita com os próprios meios, como é o método vigente no plano animal. Seria uma reviravolta, porque o justo, mesmo débil, tornar-se-ia um vencedor, porque é protegido pela Lei, e o homem injusto, que por ser forte faz-se a si mesmo de lei, tornar-se-ia um vencido, porque é um rebelde para a Lei que é contra ele.
Tal estranha afirmação da superioridade do método e da vitória segundo a justiça, como quer a Lei, não é infundada, mas baseia-se em vários fatos: 1) é evidente que o velho sistema não resolveu o problema da convivência social pacífica; 2) aquele sistema não é mais válido, porque se torna contraproducente e, portanto, deve ser eliminado, quando se passa do velho estado social caótico ao orgânico; 3) esta afirmação é confirmada pelo fato de que podemos controlar-lhe a veracidade, porque hoje se está iniciando passagem para o estado orgânico e com isso assistimos a um deslocamento na avaliação dos valores humanos. Hoje o vencedor egoísta e violento, antes honrado porque era forte e vencedor, começa a ser considerado um criminoso, inimigo da coletividade. O herói de guerra, o amo prepotente dominador, o hipócrita astuto que sabe enganar, hoje, em vez de incutir respeito, provocam revolta e, como elementos anti-sociais, são isolados para serem eliminados.
Nesta nossa época de passagem para um novo tipo de civilização, tudo isso começa a verificar-se, visivelmente, porque já se iniciou a inversão dos velhos valores. A razão desta mudança não é de caráter ético, mas biológico; é uma questão de evolução. É porque passamos ao estado orgânico, que adquire valor o fator retidão, que nesta hora serve à vida. E é por isto que se desvaloriza o fator força e domínio para impor-se coisas que servem, ao contrário, ao estado caótico. O problema é utilitário. A retidão é aceita pela vida, não por ideologias morais, mas por razões práticas de rendimento.
Tudo é relativo e evolui. Acontecerá que o princípio de retidão e justiça próprio da Lei superará o sistema vigente de luta. Isso não significa que este será abolido, mas que mudará de forma. Pelo fato de que hoje se passa ao estado orgânico da sociedade, o separatismo individualista torna-se contraproducente para a vida. É por isso que ela o deixa de lado como fase superada.
Assim a luta não terminará na sua forma atual de seleção a baixo nível evolutivo, do mais forte ou ardiloso, mas continuará em forma mais aperfeiçoada, de luta inteligente, competindo na conquista do desconhecido. Continuará em grupos sempre maiores, em que se coordenam as funções sociais e se organiza a coletividade (A Grande Síntese: "Lei das unidades coletivas"). Deverá assim desaparecer a luta individual e violenta, relegada ao submundo social. Sobre ela prevalecerá um tipo de luta mais inteligente, em nível mental, que não se rebaixa às pueris rivalidades do orgulho humano.
Já vemos o trabalho de equipe entre especialistas que unem seus esforços para um fim comum, vemos a coordenação das funções nas grandes organizações industriais, vemos a universalidade da ciência que não admite barreiras. Assim a seleção, como é lógico, realizar-se-á em outro sentido, isto é, para produzir não um indivíduo mais forte isolado, mas o inteligente indivíduo social mais apto a viver na coletividade, nela cumprindo a sua função específica. Isso não nos surpreende, porque o vemos já realizado na sociedade orgânica de células que é o corpo humano.
Para viver de tal forma, é necessário conquistar qualidades diversas daquelas que tinham valor no passado. Isto porque a vida se encontrava na fase precedente a de evolução, e o sistema de retidão e justiça da Lei era próprio de uma fase mais avançada, que não se realizava. Ora, ninguém pode parar a evolução, e com esta aqueles deslocamentos. Logo a passagem para esse modo novo de conceber e conduzir a vida não é uma utopia, mas uma realidade já em ação, porque é devida a um fenômeno natural e fatal de evolução.
Resolvido este problema, tratemos agora de conhecer mais a fundo a técnica deste novo método de vida para poder fazê-lo funcionar com nossas mãos. Falando de retidão, tínhamos dito que o homem justo, colocando-se na corrente da lei, é por ela protegido e auxiliado. Isso seria uma bela solução para resolver o problema da vida, isto é, sendo honestos, colocarmo-nos dentro da Lei e assim nos deixarmos levar por ela. Perguntamos então: é possível usar esse sistema para alcançar aquela finalidade? Para fazer funcionar a Lei em nossa vantagem basta a retidão, ou, por outro lado, precisamos também de outros fatores? Qual é a estrutura deste fenômeno? Dentro de que mecanismos se encontra o indivíduo para sua vantagem e não para seu prejuízo, como e em função de que elementos deve conduzir-se para conseguir isso?
Tudo se baseia na Lei. Mas ela não é só um princípio de retidão e justiça: é também uma vontade de torná-lo atuante, é uma corrente de seres vivos que o fazem atuar. Podemos representar o fenômeno com a imagem de uma multidão a caminho, ou antes, com a corrente de um rio sobre o qual o indivíduo se desloca com seu barquinho. Se ele rema de acordo com a Lei, isto é, no sentido da corrente, ela o ajudará. E ele avançará e seus esforços obterão o máximo de rendimento para o bem. Se, pelo contrário, o indivíduo rema contra a Lei, isto é, no sentido oposto à corrente, ela não poderá ajudá-lo, levando-o para frente Então ele retrocederá e seus esforços só obterão rendimento para o mal.
No entanto o fenômeno não se exaure aqui. Pode haver outras posições, que devemos examinar para resolver o problema apresentado acima, como o de se ser honesto e deixar-se levar. O agir segundo a justiça não nos coloca na corrente da Lei? Então nada impede que, posta a barquinha na corrente, se possa avançar sem remar. Seria uma bela solução: evoluir sem fadiga. Por que isso não é possível?
Chegados a este ponto, para compreender o fenômeno é necessário levar em conta um outro elemento, isto é, que o princípio fundamental da Lei que deve ser influente não é só o da retidão e justiça, mas também de evolução e, portanto, de movimento com essa finalidade. Assim, a Lei exige o cumprimento, também deste outro dever por parte do indivíduo, além daquele da retidão e justiça. Vai contra a corrente da Lei não só aquele que não cumpre este dever, mas também quem não cumpre o outro igualmente importante, o da evolução e movimento para realizá-la. Em suma, o homem, embora justo, se não trabalha para evoluir, é um violador da Lei, como o é quem trabalha contra ela.
Compreendido isso, vejamos quais são as outras posições, além dos dois casos extremos que acabamos de examinar, que o indivíduo pode assumir perante a Lei. Nos dois casos precedentes se ele move: 1) segundo a Lei e seguindo-lhe a corrente; 2) contra a Lei, movendo-se contra a sua corrente. Temos depois outros dois casos baseados, não sobre o movimento, mas sobre a inércia; 3) o homem justo que se recusa a trabalhar para evoluir; 4) o homem injusto, que igualmente se recusa àquele trabalho. Estes dois tipos são ambos culpados porque, dado que a Lei é movimento, o ficar parado é um atentado contra ela, é uma revolta contra o princípio de evolução, base da Lei. Quais são então as conseqüências deste erro, o de não trabalhar para avançar seguindo o movimento evolutivo?
Para melhor nos exprimirmos, representamos o fenômeno com a imagem de uma massa de seres a caminho. Poder-se-ia traçar em um desenho a estrada sobre a qual avança o movimento dessa massa, relativamente àquele percurso, o deslocamento e as várias posições do indivíduo. Facilitar-nos-á a compreensão introduzir também no fenômeno os conceitos de positivo e negativo. Isto é, qualificando com um sinal positivo tudo aquilo que está de acordo com a Lei, portanto progredindo com o próprio esforço, seguindo a corrente da evolução; e qualificando com um sinal negativo tudo aquilo que é anti-Lei, tendente portanto a retroceder, porque é contrário àquela corrente.
Examinemos agora os vários casos expostos acima. No primeiro caso o indivíduo encontra-se de pleno acordo com a Lei, porque é um justo, que se colocou e se move na corrente da evolução. Porque ele aplica os princípios fundamentais da Lei, progride em positividade, acumulando a seu favor sempre mais valores daquele tipo.
No segundo caso o indivíduo encontra-se em plena oposição contra a Lei, porque injusto, colocou-se e move-se contra a corrente da evolução. Porque ele viola os princípios fundamentais da Lei, regride no sentido da negatividade, acumulando em seu prejuízo sempre mais valores deste tipo.
No terceiro caso, o indivíduo está de acordo com a Lei, porquanto é um justo, mas está em oposição a ela, porque, recusando-se a avançar, isto é, a trabalhar para evoluir, senta-se à margem da estrada, fora da corrente que avança. Então, neste caso, temos duas forças opostas. Uma é dirigida em sentido positivo, porque funciona seguindo o princípio da retidão da Lei e tende, portanto, a acumular valores positivos a favor do indivíduo. A outra força é, ao contrário, dirigida em sentido negativo, porque funciona opondo-se ao princípio evolucionista da Lei e tende, portanto, a acumular valores negativos em prejuízo do indivíduo.
Então, a posição de justiça, a favor desse homem, segundo a Lei, é neutralizada pela posição oposta de inércia anti-evolutiva, contra a Lei, em prejuízo dele. Assim a negatividade da inércia, que recusa a evolução, anula a positividade da retidão, e o indivíduo encontra-se em estase de morte, na qual a vida pára. O resultado, permanecendo estacionário em um mundo de movimento, é superado pela massa em marcha e disso resulta um retrocesso, porque o movimento desloca tudo para diante, ao longo do caminho da evolução.
Para admitir isso, é necessário compreender que o fluxo da corrente evolutiva que avança é contínuo, portanto ligado ao tempo, como uma sua função. De fato, definimos o tempo como ritmo que regula e mede o desenvolver do transformismo fenomênico. Ora, isto verifica-se em sentido evolutivo, de modo que a passagem da corrente evolutiva é ligada à passagem da corrente do tempo, não podendo, como ele, parar. Quem se isola fora dessa corrente não a interrompe por isso, mas fica estacionado dentro dela, que continua a avançar. É assim que quem pára é ultrapassado e deixado para trás, o que eqüivale a um retrocesso involutivo, semelhante àquele a que se submete o indivíduo do segundo caso que se move contra a Lei, retrocedendo. Eis como a inércia, pelo fato de que, também, no homem justo transforma-se em involução podendo constituir-se um grave prejuízo para ele.
No quarto caso o indivíduo encontra-se, como no terceiro, em oposição contra a Lei, porque, recusando-se a trabalhar para evoluir, coloca-se fora da corrente que avança. Porém esse homem não compensa essa sua negatividade como o faz o tipo do terceiro caso, com a positividade do homem justo, mas, ao contrário, agrava-a com sua negatividade de homem injusto. Segue-se que os dois impulsos, não sendo opostos um ao outro como no terceiro caso, não se neutralizam, mas somam-se, e isso no negativo. Verifica-se, então, por falta de trabalho evolutivo, não só o retrocesso involutivo do terceiro caso, próprio do inerte que pára, mas esse retrocesso é maior pelo fato de que seu ponto de partida sendo o do injusto, e não o do justo, está mais embaixo.
O indivíduo do quarto caso encontra-se em vantagem sobre aquele do segundo, pelo fato de que, enquanto este é ativo de forma anti-Lei, isto é, trabalha para involuir, o tipo do quarto caso, com a sua inércia, paralisa esse movimento, pernicioso para ele em sentido negativo. Assim a sua inércia freia o seu retrocesso que o conduz a um ponto acima de onde chegaria se fosse ativo como homem injusto, anti-Lei. Eis que no quarto caso a inércia, como suspensão de uma atividade negativa, pode representar uma vantagem, porque é um mal menor. Se, para quem avança pelo caminho do bem, o parar é um mal, para quem avança pelo caminho do mal o parar é um bem. Ou, por outro lado, se para quem trabalha positivamente o parar é negativo, para quem trabalha negativamente o parar é positivo.
Cada indivíduo se situa numa dessas quatro posições, segundo sua natureza e seus impulsos correspondentes, e a Lei responde-lhe adequadamente. Isso coincide com o que ele merece, porque a estrutura de sua personalidade é obra sua. Com essa técnica automática cada um recebe a lição a ele adaptada. A lei quer a correção do erro, a salvação e, portanto, a evolução para atingi-la. A função da evolução é a transformação do negativo para o positivo, como a involução é função de emborcamento do positivo em negativo. Sendo a evolução uma corrente em movimento, na qual a Lei quer que se avance, é implícito que ela deixe que essa corrente leve avante quem se coloca, nela, e faça o oposto no caso contrário. Assim podemos compreender por que isso acontece. De fato, a Lei ajuda ao máximo o indivíduo do primeiro caso; pondo obstáculos, resiste ao do segundo caso; deixa entregue a si mesmos os do terceiro e do quarto casos.
Há, porém, um fato fundamental, que não admite exceções. A Lei atinge sua finalidade, que é a de fazer funcionar a evolução, e por meio dela levar todos à salvação. Qualquer que seja a posição que o indivíduo escolheu, as reações da Lei acabarão sempre por corrigi-lo do erro e fazê-lo avançar, seja porque é atraído pelo bem que conquista, seja porque procura salvar-se do mal que lhe cai em cima. Muitos procuram retroceder, muitos se põem de lado para fugir à fadiga de evoluir, mas a grande corrente da Lei perseguí-los-á, agitá-los-á, desentocá-los-á, até levá-los à salvação. Não se pode deixar de nascer e viver, não se pode deixar de aprender e evoluir: é fatal, portanto, o retorno final a Deus.