O homem em busca de felicidade e a disciplina da Lei.

Continuando falando da Divina Providência, da vontade de Deus, das desilusões e dos sofrimentos da vida, num quadro único em que cada coisa está conexa a outra, e todos os fatos e problemas estão ligados entre si, revelando-nos cada vez mais a unidade do pensamento diretor central, a sabedoria e a bondade de Deus. Mas o assunto é vasto e aparecem sempre novos aspectos a contemplar, surgem novos problemas a resolver e novas perguntas a responder. Um problema leva a outro, cada resposta provoca outra pergunta. Iremos assim avançando de maneira a compreender cada vez melhor qual é o grande plano com que Deus dirige a nossa vida e como dirige a existência do universo. Nesta viagem teremos de ir ainda mais longe que às mais magnificentes e longínquas estrelas, porque elas estão fechadas nas dimensões do espaço e do tempo, enquanto o pensamento pertence às dimensões espirituais superiores.

Mas, continuemos a desenvolver o nosso assunto atual. Vimos em que impasse nos encontramos na vida. E verificamos isto apenas num rápido esboço de explicação. Temos de compreender melhor como funciona este jogo que parece tão cruel e sem sentido; enfim, compreender as suas causas e finalidades. O embaraço é este: parece impossível atingir na terra a felicidade, apesar de ser o que todos mais almejam. A crueldade do jogo está neste fato: ter absoluta necessidade de uma coisa que nunca se. chega a possuir. Por que somos condenados a este engodo?

Todos procuram a felicidade. Quanto mais é primitivo e ignorante o ser, tanto mais acredita na ilusão e que seja possível encontrá-la na Terra. Mas, ao mesmo tempo, ele tem de compreender que uma felicidade, ao ser atingida, não é mais felicidade. O homem se acostuma a tudo e tudo perde o valor com o hábito. A satisfação habitual de todos os desejos acaba no enfado. Tudo vale e satisfaz enquanto e luta de conquista, esforço para realizar. Se após atingida a primeira meta, não surgisse outro desejo para alcançar resultados maiores, e com isso, um novo esforço, tudo acabaria no tédio. Se nós recebermos tudo de graça, sem ter dado, para ganhá-lo, prova do nosso valor, e sem ter assim um verdadeiro direito a posse, tudo acabaria anulado no vazio produzido pela sensação de nossa inutilidade. Na justiça da Lei está escrito que desfrutaremos de uma satisfação em proporção à necessidade que ela vai compensar, e ao esforço que fizermos para atingi-la. É agradável comer quando temos fome, beber quando estamos com sede e possuir as coisas de que necessitamos e pelas quais lutamos. Mas, quem tem e sempre teve de tudo, de tudo está farto e cansado. Isto chega até a destruir o desejo de viver e é justo que seja assim, porque se trata de uma vida inútil. Desse modo, os mais desafortunados são os que nasceram demasiadamente ricos, sem terem conhecido necessidades ou feito esforços para aprender alguma coisa ou procurá-la; são os que não têm nada a desejar.

Nós mesmos somos constituídos de maneira que não nos é possível aprender e progredir, sem desejar, lutar e sofrer. E como somos, queremos permanecer o mais possível apegados à vida, dentro dessa dura escola, de modo que seja feito, até no último dia, todo o esforço para aprender a lição que nos é indispensável para ascender. Esta é a mecânica íntima do jogo da nossa vida. Este é o método sábio e maravilhoso que a Lei de Deus usa para impulsionar no sentido do Alto, sem constrangimento, um ser que tem de manter-se livre, porque se não o fosse, não poderia depois ser julgado responsável e levado a aceitar as consequências dos próprios atos. Nesta Lei manifesta-se também uma vontade absoluta de que a evolução se cumpra, e isto para o bem da criatura, porque a evolução é a senda da felicidade. Mas a criatura não pode ser escravizada por Deus, que apesar de Todo-Poderoso, não é escravista. Então, que faz a Lei para que seja possível atingir seu objetivo absoluto sem ter de empregar a coação? A Lei cerca a criatura de paredes invisíveis, dentro das quais ela fica presa como um pássaro na gaiola, paredes contra as quais ela irá bater com a cabeça e machucar-se, até reconhecer a existência dessas paredes e perceber que ir contra elas é loucura que somente gera dor.

Assim, vai-se aprendendo cada vez mais a arte do sábio comportamento, em disciplina, ordem e obediência à Lei, até que a criatura não vá mais bater contra as duras paredes dessa Lei, livrando-se, assim, do choque da desilusão e do sofrimento. Isto porque a gaiola é prisão apertada só para o ser que não sabe andar dentro dela e nela movimentar-se com inteligência; mas, é palácio maravilhoso para quem o souber e já tenha batido muitas vezes contra aquelas paredes, de maneira a não provocar mais, com os seus movimentos errados, a reação que se chama dor. A Lei é realmente um palácio maravilhoso para os que aprenderam a conhecer a disposição dos seus apartamentos e instalações, a localizar as portas e as janelas, as quais permitem toda a liberdade, desde que os movimentos sejam inteligentemente ordenados. A Lei é palácio maravilhoso, repetimos, para ali morar a nossa alma, com tanto maior satisfação quanto mais se aprenderam as regras do sábio comportamento, e com tanto maior sofrimento quanto menos se conhecem estas regras. É um palácio feito de andares sobrepostos, que se apoiam uns por cima dos outros, em perfeita lógica, com passagens e escadas dos inferiores aos superiores. É um palácio em que as paredes falam e raciocinam, em que o mobiliário e as demais comodidades crescem em beleza à medida que se sobe para os andares superiores. Ainda mais, é uma máquina que obedece quando sabemos apertar os botões que a movimentam. A Lei torna-se assim um extraordinário veículo para quem tiver desenvolvido a inteligência necessária ao seu controle, um veículo de sabedoria, de poder e de felicidade. Mas, o homem atual ainda não possui essa inteligência, de maneira que, para ele, a máquina funciona muito mal, produzindo apenas atritos, choques e sofrimentos.

Este estudo da estrutura da Lei, que, queiramos ou não, é a nossa casa, dentro da qual temos de morar, leva-nos a uma consequência importante: ensina-nos o caminho para viver bem, fugindo à dor. Como vimos, na lógica da Lei, o sofrimento é tanto maior quanto mais se desce aos andares inferiores do palácio, até que nos seus subterrâneos encontram-se as cadeias torturantes a que se costuma chamar inferno; e tanto menor à medida que se sobe para os andares superiores, onde finalmente encontramos nas torres altíssimas do palácio a feliz liberdade a que costumamos chamar paraíso.

Dentro desse palácio, habitamos no andar que nos corresponde conforme a nossa natureza, o qual é precisamente aquele que construímos voluntariamente para nós com as nossas obras. No entanto, a porta que leva aos andares superiores está sempre aberta a todos. O problema é só um: descobrir onde ela está, por ela entrar e, uma vez achada a escada para subir, escalar degrau a degrau com o nosso esforço. Este é o caminho lógico, justo, sem enganos, para vencer a dor e aproximarmo-nos da felicidade. Pode parecer uma maneira dura de falar, mas, tudo isto é claro, sincero e honesto. Acredita-se, porém, mais nas felicidades que o mundo promete porque, não exigindo o nosso esforço, são fáceis e cômodas. Mas, elas se desvanecem como bolha de sabão. Isto é lógico. Só os ignorantes podem acreditar que seja possível ganhar o que não foi merecido. Exatamente por isso que o mundo mais anseia, é justo que recolha desengano, parecendo traição.

De tudo isso, pode-se tirar uma conclusão muito importante, mesmo no terreno pratico, ou seja, que existe um meio certo para fugir à dor. Esse meio é o evoluir. Isso quer dizer que o sonho de felicidade aninhado no fundo de cada alma não se encontra ali para nunca chegar a ser satisfeito, não é um impulso traidor que tenha apenas a função cruel de nos levar ao engano. Esse instintivo e irresistível desejo de felicidade tem um sentido sadio e verdadeiro, porque o seu escopo é o de nos empurrar para a frente, constrangendo-nos a experimentar muitas formas enganadoras de felicidade, até encontrarmos a verdadeira. Assim, o homem, fechado na sua atual moradia ou apartamento, que é o plano de vida ao qual pertence, vai tateando pelas paredes até encontrar a porta e, desse modo, a escada que conduz ao andar superior. O homem supõe que ela possa estar aqui ou acolá, e assim vai experimentando o que se encontra no seu plano: a riqueza, o poder, a glória, os gozos dos sentidos etc. Ele julga encontrar assim o caminho para satisfazer o seu desejo de felicidade. Mas, logo repara que não encontrou a porta que almejava, mas apenas uma porta que conduzia a uma parede dura, sem saída. Então ele diz ter sido enganado e começa de novo a experimentar por outro lado, sempre à procura da porta que o levará a verdadeira felicidade.

Isso parece uma condenação. No entanto, o homem, correndo atrás das suas miragens, vai trabalhando experimentalmente, e assim aprendendo o caminho certo, desenvolvendo a sua inteligência. Cada desilusão é uma lição aprendida, um erro no qual não cai mais, um degrau subido na escada da evolução. Se tudo isso parece ser traição, não o é de fato. Nem para a Lei, que atinge, assim, o seu verdadeiro objetivo - fazer evoluir o homem, nem para o ser humano que, a seu turno, acaba por evoluir, o que constitui o verdadeiro objetivo de sua existência. Só quem não compreendeu nada desse sábio jogo, pode queixar-se dele. Mas, agora, que vemos claro e compreendemos o seu significado e objetivo, é mister concluir que não se poderá imaginar método mais perfeito e sabedoria mais profunda.

É lógico que para o homem tudo isso represente trabalho. Ele quereria satisfazer o seu desejo de felicidade sem fazer esforço algum. Mas, a Lei é justa e nada concede gratuitamente. É precisamente a dureza dessa justiça a melhor garantia de que as promessas da Lei serão mantidas, enquanto vemos que os fáceis caminhos do mundo levam ao engano. Por razões profundas que pouco a pouco veremos, a evolução é como a subida de uma montanha. E temos de subi-la com nossos próprios esforços. No entanto, somos preguiçosos e preferimos ficar sentados à beira do caminho. Mas, desse modo, não nos afastamos do feio pântano que se encontra na base da montanha. E no pântano estão todas as dores, enquanto que no cume da montanha estão todas as felicidades. O terreno, porém, que pisamos na subida é de pedras, escorregadio, cheio de tropeços. Paramos, então, desanimados, porque, enquanto a alma almeja felicidade, temos de enfrentar sofrimento. Procuramos de todas as maneiras fugir dele, seguindo travessas mais fáceis ou atalhos para encurtar o caminho da felicidade. Para nossa comodidade, quereríamos enganar e contraverter a Lei, mas, como é lógico e justo, não conseguimos desta maneira senão ludibriar a nós mesmos, porque ao invés de chegar à felicidade chegamos a dor.

Não há dúvida, tudo isso é bem duro. Porém, a Lei é honesta e não nos engana. Cada esforço para subir recebe a sua recompensa e, em cada passo dado à frente, sobe-se um pouco no caminho que nos afasta do sofrimento e nos leva à felicidade. Cada prova superada representa uma conquista de sabedoria, um desenvolvimento de inteligência, um enriquecer de experiências e um amadurecimento superior, que nos conferem novos poderes, os quais nos ajudam a subir sempre mais rápida e facilmente. Cada luta vencida contra a inferioridade da própria natureza é um degrau escalado; significa crescer em estatura por ter atingido uma posição mais elevada; e um empecilho removido para nos erguermos, ganhando cada vez mais altura. Este é o caminho da libertação marcado pela Lei, e não existe outro.

Tudo se transforma à medida que subimos; o terreno, a paisagem, o ambiente, a visão, o ar que respiramos, como se transformam, também, para a espiritualidade, os próprios conceitos de liberdade e felicidade.

Para os animais que evoluíram até ao plano humano, este pode parecer um paraíso. Mas, para os que pertencem a planos mais adiantados, nosso mundo pode parecer um inferno. Se é fácil e natural a um diabo viver entre diabos, não o é para um anjo. Mas, a condenação a essa descida pode verificar-se por dois motivos: ou para o ser pagar as suas dívidas ou para cumprir uma missão em benefício dos seus irmãos inferiores.

Este é, em suas linhas gerais, o mecanismo da Lei ao qual estamos encadeados. Iremos estudá-lo sempre mais de perto, para aprendermos a movimentar-nos dentro dele, de maneira a não provocarmos dor, mas felicidade. O que queremos salientar na conclusão do presente capítulo é a absoluta impossibilidade de nos evadirmos dessa Lei, porque ela representa o princípio fundamental da nossa própria vida. Não há filosofia, ignorância ou subterfúgio que nos possa eximir dessa obediência. Podemos inverter tudo, mas, dessa maneira, nós é que ficamos em oposição à Lei, que continua de pé. Esta obediência é o nosso único apoio, porque fora da Lei estamos fora da vida. A fuga à dor não está na revolta. Isso piora a situação. Quando u‘a máquina não funciona, não é possível ser-se tão ignorante que se acredite possa ela ser consertada com pancadas e pontapés. Saindo dos trilhos da estrada, não conquistamos a liberdade, mas caímos no abismo. O homem está acostumado a iludir as leis humanas, e julga possível e vantajoso fazer o mesmo com a Lei de Deus. Como se pode evadir, se ela está dentro de nós, representando a nossa própria vida, e se nosso afastamento dela conduz à morte? É possível burlar as leis humanas, mas não é possível enganar a Lei de Deus.

Essa Lei está em todos os lugares e em todos os tempos, dirigindo a vida em todos os seus níveis. Ela existe para todos. Ninguém lhe escapa, qualquer que seja a sua filosofia ou religião. A Lei de Deus é verdadeira e funciona tanto para os católicos, os protestantes, os espíritas, os budistas, os maometanos etc., como para os ateus que tudo negam. Um avião, se violar as leis que regem os seus movimentos, cai da mesma forma, qualquer que seja a religião dos seus comandantes ou mesmo que sejam descrentes. Assim também, o organismo humano tem saúde ou adoece independente da fé ou filosofia do indivíduo. A Lei de Deus é a lei universal da vida, como universais são as leis do mundo físico e dinâmico que dela fazem parte. Neste caso, trata-se de leis morais e espirituais, positivas como as outras, e que um dia a ciência descobrirá e demonstrará para o homem do futuro. Esta é a Lei que estamos estudando e explicando para os homens de boa vontade que tenham ouvidos para ouvir, e desejem, para o seu bem, ser orientados na vida.